A Convenção sobre os Direitos da Criança1 das Nações Unidas (20 de novembro de 1989) modifica o estatuto das crianças e jovens no espaço publico e privado, sobretudo a partir do artigo 12.º: “direito de exprimir livremente a sua opinião sobre as questões que lhes dizem respeito, sendo devidamente tomadas em consideração as opiniões da criança, de acordo com a sua idade e maturidade”. Confere pela primeira vez, às crianças e jovens, poder para exprimir e participar e, às famílias e sociedade, obrigação jurídica e política de os ouvir e tomar em consideração as suas aspirações e soluções.
Apesar de ser o tratado mais ratificado no mundo e ter efeitos vinculativos nas legislações nacionais e expressão direta nas vidas das crianças e jovens, o fecho temporário das escolas devido à pandemia Covid-19 diminuiu as oportunidades de participação infantil e juvenil e, por isso, urge reforçar esta componente fundamental do currículo.
Ouvir – Agir – Mudar2 (outubro de 2020) é um manual da Divisão do Conselho da Europa para os Direitos da Criança que, com base na escuta de 120 crianças, jovens e adultos europeus de diferentes idades e condições, foi criado para moldar o futuro com base no exercício de direitos e na participação de qualidade, que inclui crianças e jovens.
Tomando este manual como ponto de partida para a reflexão e ação, o que é a participação infantil e juvenil?
Segundo o Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas (2018):
- É uma liberdade – e não uma obrigação – porque é fruto da vontade de cada um. Exercê-la pode inclusive dar lugar a consentimento prévio informado que, para crianças abaixo dos 16 anos, deve ser assinado pelos pais ou responsáveis legais, depois de informados que podem retirá-lo quando quiserem;
- É universal, devendo ser aplicado a todos sem discriminação - incluindo crianças do pré-escolar e jovens não matriculados na escola - em todos os contextos (escola, comunidade, família, nacional e mundial);
- É em si mesma um fim, servindo para exprimir uma visão própria, mas é também um meio porque contribui para o alcance de outras liberdades, como a da saúde e da educação;
- É fonte de segurança porque gera a oportunidade de tomar consciência e denunciar situações de violência, abuso, ameaça, injustiça;
- É poder/ empoderamento porque cria oportunidades de desenvolvimento de competências (e.g. responsabilidade ética, envolvimento cívico), sentimentos (e.g. respeito pelos outros e bem comum, autoconfiança, pertença) e experiência (pp. 14, 15).
Na base deste entendimento comum, como melhorar a qualidade da participação das crianças e jovens?
- Baseá-la em informação, recursos e abordagens de trabalho relevantes, diversificadas e apropriadas à idade e capacidades de todos – o direito à informação (artigo 17.º da Convenção) melhora e incentiva a participação;
- Gerar ideias e atividades significativas e úteis para os participantes e sociedade;
- Criar oportunidades de envolvimento de todos, evitando a discriminação;
- Proporcionar momentos de preparação das crianças e jovens, de modo a tomarem consciência dos próprios direitos e formas de os exercer, bem como dos professores, parceiros e comunidade para criar e apoiar oportunidades de participação e formar audiências respeitosas, capazes de escutar, levar a sério e trabalhar em conjunto com os jovens cidadãos (pp. 18, 19);
- Criar momentos de reflexão e autoavaliação contínua para melhorar e amplificar participantes, espaços, públicos e oportunidades – “identificar os desafios que enfrentamos e procurar conselhos de outras pessoas experientes (incluindo crianças [e profissionais seniores, que devem ser envolvidos também no recrutamento de participantes]) é uma parte essencial do processo” (p. 21).
Que ideias podem contribuir para melhorar a participação na escola? Exemplos:
- Ferramenta de avaliação de participação infantil3 do Conselho da Europa para avaliar a política e prática da Recomendação sobre Participação que evidencia que o simples processo da sua aplicação incrementa a consciência do valor da participação, incentiva novas oportunidades, para além de identificar lacunas na legislação, políticas e implementação.
Constituída por 10 indicadores, tem como indicador “7. As crianças são informadas sobre o seu direito de participar” que estabelece que o governo e departamentos que prestam serviços essenciais às crianças devem produzir informação, em formatos acessíveis a várias idades e capacidades, sobre direitos, mecanismos, legislação e oportunidades de participação. Desta informação podem fazer parte websites - e.g. o governo alemão criou o portal4 com informação útil e de interesse das crianças (p. 21) e linhas de apoio e de reclamação - Mecanismos de Reclamação Amigos da Criança5.
- Escolas que respeitam os direitos6 e Abordagem Reggio Emilia7 em que crianças e jovens, a partir de espaços formais, identificam e investigam questões e teorias/ opiniões, encontrando inspiração e aplicação para as suas ideias em espaços informais do seu dia-a-dia.
- Código ou carta de conduta compatível com os direitos expressos na Convenção, criado e negociado entre as crianças e jovens e os professores e que responde a questões como: As crianças ou jovens… Podem escolher tarefas e formas como aprendem? Participam na avaliação do seu trabalho e dos seus pares? São responsáveis pela organização do espaço e recursos? Apoiam-se e colaboram entre si? Ouvem-se uns aos outros e respeitam o direito de todos à educação? Respeitam as opiniões uns dos outros, evitando comentários discriminatórios? Respeitam, apoiam e valorizam as diferenças/ semelhanças uns dos outros? (p. 30).
- Saúde amiga da criança8 que reflete a Recomendação do Conselho da Europa para participação das crianças e jovens nas decisões sobre a sua saúde e estilo de vida, sobretudo à medida que a idade e maturidade aumenta - em Espanha há a rede Hospitais Amigos da Criança9 com informação acessível que incentiva decisões saudáveis.
São inúmeras as práticas que podem inspirar a ação das bibliotecas – lojas de direitos da criança com serviços de informação e aconselhamento (p.37), sites com identificação e contacto de crianças e jovens que se voluntariam a participar (p. 50)… - e, por isso, a Secção 5 do manual (pp. 57 - 61.) reúne os principais Recursos (legais, de advocacia e avaliação, guias, atividades, instituições) e ligações com que a participação em território europeu pode contar.
A idade é fator de discriminação e o obstáculo será mesmo a atitude dos adultos que frequentemente subestimam as capacidades destes cidadãos limitando a sua capacidade de pensar, agir e voar.
6. (s. d.). Escolas que Respeitam os Direitos - Criando lugares seguros e inspiradores para aprender. Reino Unido. Disponível em: https://www.unicef.org.uk/rights-respecting-schools/ [acedido em 22 de fevereiro de 2021].
O projeto Navegar com a Biblioteca Escolar é o contributo da RBE para o programa das Comemorações dos 500 anos da Viagem de Circum-navegação comandada por Fernão de Magalhães, que se celebram entre 2019 e 2022.
O foco deste projeto é dar voz e protagonismo aos alunos, desafiando-os a explorar e produzir recursos. Está desenhado em torno de seis grandes desafios: 1) Desbravar caminhos 2) Viajar para conhecer 3) Quem somos nós? 4) Descobrir o outro 5) Descobrir o descobridor 6) Navegar nos textos. O principal objetivo destes desafios é proporcionar, aos alunos, ocasiões de desenvolvimento das suas competências de criatividade, pesquisa, exploração, colaboratividade e espírito crítico.
Muitas bibliotecas escolares têm respondido a estes desafios, mostrando o seu dinamismo e vitalidade, mesmo em tempos difíceis. Com o objetivo de dar reconhecimento e visibilidade ao trabalho desenvolvido, está disponível, no SI, até 31 de março, um formulário para recolher informação sobre as atividades e recursos produzidos no âmbito deste projeto.
Vizinho, de acordo com o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa é um adjetivo que designa o próximo, que está perto, assim como, em sentido figurado, descreve a relação do que é semelhante ou tem alguma analogia ou afinidade.
As relações de vizinhança são muito diferentes consoante vivamos num centro urbano, numa aldeia ou no meio rural, num prédio, numa moradia ou numa quinta. As regras de confinamento, que nos obrigam a permanecer em casa muito mais tempo do que aquilo a que estávamos habituados, condicionam estas relações, aproximando ou, pelo contrário, gerando mal-estar.
Há vizinhos discretos e há vizinhos que nos atormentam a vida. Há vizinhos que são família e há vizinhos que são como fantasmas. Há vizinhos com rotinas que reconhecemos e há vizinhos com hábitos que não compreendemos. Há vizinhos que cantam no duche, que jogam à bola sem balizas, que nos abrem o apetite com os seus cozinhados, que discutem em estéreo ou que estão sempre em festa…
Se, por um lado, a pandemia acentuou a relação de interdependência entre as pessoas, por outro lado, tornou regra o distanciamento social. Num tempo em que estamos afastados dos que nos são mais queridos, como vivemos com os que nos estão mais próximos?
A leitura mediada de livros álbum é uma oportunidade para criar um espaço/ tempo para pensar em conjunto e partilhar ideias, experiências e emoções. Sugere-se um conjunto de álbuns que, pelas suas características textuais e gráficas, podem ser utilizados com alunos de diferentes faixas etárias.
Os vizinhos, de Einat Tsarfati. Editora Fábula
«O prédio onde eu moro tem sete andares. E em cada andar há uma porta um bocadinho diferente. Enquanto sobe as escadas para chegar a casa, uma menina curiosa observa os pormenores, sente os cheiros e ouve os sons de cada andar. Através deles, imagina o que haverá por detrás de cada porta e na sua cabeça os seus vizinhos são fantásticos acrobatas, ladrões de obras de arte, músicos… em contraste com os seus pais, que são muito aborrecidos. Mas será que é mesmo assim?.» (resenha da editora)
«Este é um livro para pessoas que gostam de observar pessoas, como acontece com Graça, a protagonista desta história, contada com cores quentes, contornos policiais e alguma intriga internacional. Graça desconfia que o vizinho do 1.º direito anda a planear um assalto. Será verdade? Pelo caminho vamos conhecer várias vidas do prédio em frente: os clientes do Café Dias, um músico que dá concertos para a vizinhança e um fotógrafo incompreendido, entre outras. Quem é que observa quem? Só saberemos no final da investigação em curso.» (resenha da editora)
Estranhóides, Eva Montanari, Livros Horizonte
«Qual a melhor maneira de fazer amigos quando se muda para um prédio novo? Espreitando os seus moradores pelo buraco da fechadura! Só que, vistos desta maneira, mesmo nas suas tarefas mais normais, os vizinhos parecem personagens bizarros, estranhos. Estranhóides, está bem de ver. Até que decidimos passar a conhecê-los melhor…» (resenha da editora)
Perto, de Natalia Colombo, Kalandraka
«O senhor Pato vai trabalhar todos os dias. O senhor Coelho também vai trabalhar todos os dias. Cruzam-se sempre...
"Perto" é uma fábula sobre a falta de comunicação, uma reflexão poética e profunda sobre as relações interpessoais e o individualismo, os desejos e as emoções. Do ponto de vista literário, destaca-se pela sua simplicidade narrativa e pela engrenagem interna do relato, que plasma o paralelismo entre as ações dos protagonistas: um pato e um coelho que vivem encerrados na sua solidão; nesse sentido, a obra convida o leitor a não voltar as costas aos outros.» (resenha da editora)
Pistas para discussão:
O que sabemos sobre os nossos vizinhos? Pode-se procurar histórias de vida, reais ou deixar a imaginação tomar as rédeas do nosso pensamento.
Que valores são realmente importantes para estabelecer relações de boa vizinhança? Podemos começar pelo ponto de vista ambiental: Como pensamos as questões da reciclagem e reutilização, dos consumos e conservação em partes comuns, do ruído? Do ponto de vista cultural, o que podemos ganhar com a diversidade? E do ponto de vista social, estaremos atentos e disponíveis para apoiar quem precisa?
O projeto Brain Ideas foi desenvolvido pela DECO a pensar nos jovens, nas escolas e nas famílias.
O Jogo de Tabuleiro 'Brain Ideas 2.0' tem como objetivo aumentar o conhecimento relativamente ao valor da Propriedade Intelectual, enquanto ferramenta para proteger a criatividade e a inovação. Promove a reflexão e o debate sobre os vários temas relacionados com a Propriedade Intelectual, nomeadamente os produtos originais e a contrafação, os direitos de autor, as fontes legais de conteúdos digitais e a pirataria.
A revista mensal digital gratuita da Fundação José Saramago comemorou em dezembro o seu centenário. Tem nome de mulher, Blimunda, a protagonista do livro Memorial do Convento (1982) de José Saramago que sabe ver o interior das pessoas e colecionar vontades.
O lançamento do seu primeiro número, em junho de 2012, coincidiu com a abertura ao público da nova sede na Casa dos Bicos que, seguindo os princípios da Fundação, da Declaração Universal dos Direitos Humanos e Carta Universal dos Deveres e Obrigações dos Seres Humanos1, tem sabido conjugar questões literárias e da vida cultural portuguesa com temas ambientais e sociais que exigem pensamento e ação coletiva.
A 12 de fevereiro 2021 é publicada a 101ª edição2 da revista num novo formato que facilita a leitura, partilha e permanente atualização que conta com novas secções, entre as quais “Cadernos do Centenário - José Saramago: os primeiros cem anos (1922-2022)”, dedicado aos cem anos do nascimento cidadão e escritor que se assinala a 16 de novembro de 2022.
Carlos Reis, Comissário para o Centenário, inaugura esta secção com um texto sobre a preparação da efeméride, no qual afirma que a Fundação José Saramago tem um papel central na sua conceção e implementação, mas outros atores e entidades desempenharão um papel complementar, gozando de autonomia na reinterpretação da intervenção cívica e literária de Saramago. Esperam-se abordagens a partir de diferentes artes e linguagens (cinema, teatro, dança, banda desenhada, pintura) e perspetivas (literatura, história, ética, democracia, meio ambiente, Deus), à luz das quais se compreende a projeção nacional e internacional do autor e atribuição do Prémio Nobel em dezembro de 1998.
O centenário tem um logotipo 3 criado pelo designer espanhol Manuel Estrada, autor do logo da Fundação.
O seu programa está a ser preparado e incide em quatro eixos:
1. Biografia, formação e ação cívica na comunidade;
2. Leitura e debate em escolas, bibliotecas, reuniões académicas que tem na Carta Universal de Deveres o seu documento de referência;
3. Publicações a partir de reedições da obra e de trabalhos de investigação publicados em quase 60 países e mais de 40 idiomas;
4. Reuniões científicas de natureza académica realizadas no mundo.
A RBE partilha da responsabilidade e privilégio coletivos desta comemoração e, por isso, a 11 de dezembro de 2020, dia seguinte ao Dia Internacional dos Direitos Humanos, publicou no seu Portal e Blogue propostas de educação centradas na reflexão e ação dos jovens e que têm por base a Carta Universal de Deveres e outros textos de Saramago. Elas estão reunidas em O dever dos nossos deveres e serão alargadas e aprofundadas ao longo dos dois anos de comemoração. Para a RBE é fundamental a criação de oportunidades em que todos exerçam os seus direitos e o cultivo de uma responsabilidade ética e cívica pelos outros e comunidade, capaz de despertar da indiferença e apatia e incentivar à prática da bondade que deve prevalecer e orientar a construção do conhecimento e uso de tecnologia digital. Nas palavras de Saramago:
“Alguém não anda a cumprir o seu dever. Não andam a cumpri-lo os governos, porque não sabem, porque não podem, ou porque não querem. Ou porque não lho permitem aquelas que efetivamente governam o mundo, as empresas multinacionais e pluricontinentais cujo poder, absolutamente não democrático, reduziu a quase nada o que ainda restava do ideal da democracia. Mas também não estão a cumprir o seu dever os cidadãos que somos. Pensamos que nenhuns direitos humanos poderão subsistir sem a simetria dos deveres que lhes correspondem e que não é de esperar que os governos façam nos próximos 50 anos o que não fizeram nestes que comemoramos. Tomemos então, nós, cidadãos comuns, a palavra. Com a mesma veemência com que reivindicamos direitos, reivindiquemos também o dever dos nossos deveres. Talvez o mundo possa tornar-se um pouco melhor.”4
Para alimentar ideias e palavras do autor, as bibliotecas escolares dispõem ainda do caderno de atividades da Fundação para o ano letivo 2020/ 2021, Cá dentro, lá fora 5 e série documental Herdeiros de Saramago6, estreada a 16 de novembro, data de aniversário do escritor e que liga a ficção à vida de 11 jovens escritores de língua portuguesa a quem foi entregue o Prémio Literário José Saramago.
No último artigo publicado pela RBE sobre avaliação - A avaliação formativa ao serviço das aprendizagens: o contributo da biblioteca escolar- foram apresentados os fundamentos que sustentam a centralidade da avaliação formativa para o sucesso da aprendizagem e realçada a necessidade de integrar a avaliação em todas as interações da sala de aula, de forma a regular as aprendizagens dos alunos e as práticas pedagógicas.
Para implementar uma sólida cultura de avaliação para as aprendizagens, que adequa as estratégias e tarefas a cada aluno e fomenta a sua autorregulação (Perrenoud, 1998), com o objetivo último de melhorar a aprendizagem, é necessário garantir “a promoção e o recurso, de forma integrada, a um ensino centrado no aluno, mas alinhado com o currículo e com práticas de avaliação” (OCDE, 2013, p. 110).
As rubricas - conjunto coerente de critérios para o trabalho dos alunos que inclui descrições dos níveis de qualidade de desempenho (Brookhart, 2012) - podem contribuir para a transparência da avaliação, pois estabelecem metas de aprendizagem, sendo os critérios explícitos, quer para os professores quer para alunos. De facto, como nos diz Domingos Fernandes, “o foco tem de ser mais no que os alunos têm de aprender e saber fazer e menos no que estamos a pensar ensinar” (Fernandes, 2020, p.5).
Nesse sentido, as rubricas têm a vantagem de permitir ao:
- aluno – conhecer o que se espera dele, em cada tarefa ou atividade, e guiá-lo durante a sua aprendizagem, permitindo-lhe situar-se num determinado nível de desempenho;
- professor – oferecer uma descrição detalhada das aprendizagens dos seus alunos, permitindo-lhe situá-los num determinado nível de desempenho; atuar de forma eficaz e atempada, isto é orientar a sua ação pedagógica, respondendo a necessidades específicas devidamente identificadas e respeitando ritmos e tempos de aprendizagem dos alunos.
As rubricas são especialmente adequadas a tarefas com algum grau de complexidade e quando os resultados de aprendizagem pretendidos são desempenhos. Nesse sentido, uma descrição clara do desempenho esperado é fundamental, assim como a adequação dos critérios escolhidos (Allen & Tanner, 2006).
As tarefas devem ser relevantes e desafiarem os alunos, mas estarem alinhadas com o currículo, para promoverem aprendizagens efetivas, mobilizando conhecimentos e competências de forma contextualizada (debates, projetos, tarefas de investigação, exposições orais, resolução de problemas, ...).
A escolha da tarefa deve ter em conta os objetivos de aprendizagem, isto é as aprendizagens que se espera que os alunos façam. Posteriormente, define-se a respetiva rubrica de avaliação que integra:
- os indicadores de desempenho, isto é os comportamentos observáveis;
- os critérios de desempenho, isto é os níveis de qualidade de cada desempenho.
Estes critérios de desempenho, ou níveis, devem ser claros para que se possa refletir sobre o progresso obtido, tendo em conta os objetivos de aprendizagem.
Tal como nos diz Brookhart (2012), as rubricas podem ser analíticas - descrevem o trabalho em cada critério separadamente – ou holísticas - descrevem o trabalho aplicando todos os critérios ao mesmo tempo e permitindo um juízo geral sobre a qualidade do trabalho. De realçar que as rubricas analíticas permitem dar feedback de qualidade aos alunos e dão mais informações ao professor para adequar a sua prática pedagógica.
A biblioteca escolar é um aliado importante neste processo, quer de trabalho colaborativo para o desenvolvimento de tarefas multidisciplinares, quer de apoio ao trabalho a realizar com os alunos. As práticas de coensino[1] e coavaliação em articulação com o professor bibliotecário têm vindo a tornar-se cada vez mais usuais em Portugal, sobretudo em projetos em torno do desenvolvimento da literacia da leitura, da informação e dos media[2], com um impacto muito positivo no trabalho colaborativo e na qualidade dos processos de ensino e de aprendizagem.
A título de exemplo, e tendo em conta o Referencial Aprender com a Biblioteca Escolar, apresentamos um exemplo de rubrica, para o ensino secundário, na área da literacia da informação.
Segue-se um exemplo criado pela professora bibliotecária do Agrupamento de Escolas de Marvão, Carla Cordeiro, em articulação com os docentes do 1º ciclo, no âmbito da literacia da leitura.
De realçar que o trabalho articulado entre os docentes das várias áreas curriculares e a biblioteca escolar permite inovarpráticas, quer ao nível do ensino, quer da própria avaliação, promovendo situações de cooperação efetiva, com ganhos claros para as experiências de aprendizagem que se proporcionam aos alunos.
Desta forma, num trabalho articulado, promovem-se situações de aprendizagem diversificadas e mobilizadoras de múltiplas literacias, consentâneas com as definidas no Perfil do Aluno à Saída da Escolaridade Obrigatória e promovem-se práticas de avaliação formativa sistemáticas e contínuas, tal como preconizado no DL 55/2018, isto é enquanto “parte integrante do ensino e da aprendizagem, tendo por objetivo central a sua melhoria baseada num processo contínuo de intervenção pedagógica, em que se explicitam, enquanto referenciais, as aprendizagens, os desempenhos esperados e os procedimentos de avaliação” (DL 55/2018, Artigo 22.º).
[1] Coensino – dois ou mais professores ensinam o mesmo grupo de alunos.
[2] Para além dos projetos nacionais da RBE, as bibliotecas escolares têm um referencial para o desenvolvimento destas literacias em contexto educativo – o Referencial Aprender com a Biblioteca Escolar.
Referências
Allen, D. & Tanner K. (2006). Rubrics: Tools for making learning goals and evaluation criteria explicit for both teachers and learners. CBE Life Sciences Education, 5(3), 197-203.
Brookhart, S. (2012). How to create and use rubrics for formative assessment and grading. Alexandria, VA: ASCD.
Fernandes, D. (2020). Rubricas de Avaliação. Folha de apoio à formação - Projeto MAIA. Lisboa: Instituto de Educação da Universidade de Lisboa e Direção Geral de Educação do Ministério da Educação.
Global Education Monitoring [GEM] Report 20201 (resumo2 em português) é o quarto relatório anual da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) que monitoriza, em 209 países, a evolução das metas dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável em educação (ODS 4).
Destaca que 258 milhões de crianças e jovens foram excluídos da educação e a pobreza é a principal razão, apesar de existirem outros fatores de exclusão:
- Casamento (117 países) e trabalho infantil (20 países não ratificaram a Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho que o proíbe);
- Falta de consideração de necessidades especificas (somente 41 países reconhecem oficialmente a linguagem de sinais para surdos e ainda menos aplicam design universal) e falta de consenso sobre compreensão da inclusão;
- Segregação de povos e grupos de pessoas.
Alerta para que no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (PISA) 2018, um em cada cinco alunos de 15 anos afirmou sentir-se estranho à escola; crianças com deficiência têm duas vezes e meia mais probabilidade de nunca ir à escola; alunos de 10 anos em países de renda anual média-alta ensinados num idioma diferente da língua materna pontuam um terço abaixo dos nativos; 40% dos países mais pobres não conseguiram apoiar alunos em risco durante a crise sanitária Covid-19. Incentiva os países a concentrarem-se nos mais desfavorecidos à medida que as escolas reabrem.
Porque a recolha de dados de qualidade - inclusive dos que não frequentam a escola – e participação é fundamental, GEM 2020 lança uma campanha digital All means All/ Todos significa Todos3 de que faz parte uma sondagem/ votação global com base em 10 recomendações para o futuro da educação inclusiva.
Dos aspetos sublinhados no relatório destaca-se no contexto da biblioteca:
1. Tratar cada aluno com dignidade
Nenhuma característica individual determina competências, comportamentos ou identidades e, por isso, há que romper a prática, pseudo-facilitadora de planificação e avaliação, de atribuição de rótulos que diminuem o valor de cada um e podem ser profecias auto-realizadas. O relatório apresenta evidências de que populações maioritárias tendem a estereotipar alunos minoritários e marginalizados: na Suíça meninas interiorizam que profissões em ciências, tecnologia, engenharia e matemática são mais próprias para rapazes; no Brasil, e outros países, alunos negros reprovam e são induzidos a escolher mais cursos técnicos e profissionais do que colegas brancos; na China professores têm piores perceções de alunos migrantes rurais do que dos colegas urbanos; alunos refugiados turcos sentem-se estigmatizados e isso torna-os mais vulneráveis à depressão.
Contra o preconceito e status quo que impede que cada um atinja o máximo das suas capacidades GEM 2020 afirma a tese “a diversidade é uma força que deve ser celebrada”. Pobres; raparigas; pessoas com necessidades especiais e deficiência; refugiados; LGBT+; minorias étnicas, linguísticas, religiosas, indígenas; deprimidos; obesos; habitantes de zonas rurais; vítimas de bullying/ maus tratos; delinquentes; órfãos; velhos/ novos… todos nos identificamos com várias condições e circunstâncias pois “A única coisa que temos em comum são as nossas diferenças”.
2. Apoiar família e comunidade
Pais com crianças e jovens com deficiência ou vítimas de segregação têm maior probabilidade de ser pobres, ter nível de educação reduzido, enfrentar obstáculos para ir à escola e trabalhar com professores, pelo que precisam de apoio na identificação e gestão das suas necessidades, bem como de informação, confiança e solidariedade. Frequentemente são eles próprios quem cultiva crenças discriminatórias: 15% dos pais na Alemanha e 59% na China (Hong Kong) temem que seus filhos com deficiência sejam um obstáculo à aprendizagem dos outros.
O fecho das escolas provocado pela pandemia reforça a ligação à família e, por isso, programas e ações de formação em literacia familiar feitos com a RBE, devem ser reforçados e multiplicados.
3. Criar atividades com base numa abordagem e avaliação relevante e flexível do currículo
- Desenvolver um currículo comum que responda a necessidades fundamentais de todos, inclusive em risco de exclusão, trabalhado de forma articulada/ interdisciplinar, ligado às experiências de vida de cada um (pp. 132 segs.);
- Valorizar a avaliação formativa, centrada nos alunos e que apoia as suas aprendizagens, em detrimento da avaliação sumativa baseada num modelo;
- Selecionar dados que comprovem a implementação de medidas e diferenças para que a consciencialização gere melhoria e suporte a difusão – há uma carência persistente de dados de população marginalizada que agrava a sua invisibilidade e falta de meios (pp. 149 segs.), são formas de proporcionar educação de qualidade a todos, sem exceção.
Em Portugal os documentos orientadores 2017/ 2019 - Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, Regime Jurídico de Educação Inclusiva, Aprendizagens Essenciais Ensino Básico/ Secundário – incentivam este processo, mas a pandemia fez estagnar ou, mesmo retroceder, a participação das crianças e jovens na vida da escola e são sobretudo os mais desfavorecidos os mais afetados.
O World Inequality Database on Education (WIDE) e as ferramentas do GEM 2020 Scoping Progress in Education (SCOPE) e Profiles Enhancing Education Reviews (PEER) podem ajudar a monitorizar políticas sobre educação inclusiva.
4. Partilhar conhecimento, livros e recursos onde todos se sintam representados
Sem diminuir a importância da literacia dos media e informação e acesso aberto para a educação inclusiva, GEM 2020 levanta a questão de que “os livros didáticos podem perpetuar estereótipos” ao representarem grupos minoritários como “outros” e associarem-nos a características que limitam o potencial de cada um. Exemplo: frequentemente nos seus textos e imagens as mulheres são sub-representadas e estereotipadas, surgindo em papeis de menor visibilidade, prestígio e liderança, o que pode levar leitores a sentirem-se mal representados e compreendidos, frustrados e alienados (pp. 144 segs). Há mesmo temas cuja abordagem deveria ser explicitamente discutida e desconstruída à luz dos direitos humanos universais e interdependentes, de modo a tomar-se consciência dos fatores que envolvem a história de segregação e conflito entre países e populações e de como subsistem no quotidiano, manipulando perceções da realidade – exemplos: escravatura, holocausto, colonialismo, migração, nacionalidade, identidade de género.
Para esta abordagem crítica e inclusiva da leitura e ensino da História o Encontro de Ministros da Educação sobre A educação para a cidadania na era digital4 (26 de novembro de 2019) incentivou o desenvolvimento de competências para a cultura democrática para que jovens possam crescer com sentimento de adesão aos valores democráticos e ligação dentro e entre países. Neste encontro foi proposta a criação de um Observatório do Ensino de História na Europa5 que viria a ser criado, por Portugal e 16 Estados-Membros do Conselho da Europa, a 12 de novembro de 2020 e cujas publicações e projetos 6 promovem, não uma normalização da forma como a História é ensinada, mas uma visão multiperspetiva, mais completa e rica do passado - a História é de todos, mas os pontos de vista variam segundo o contexto e lugar de fala – que prepara para uma vida boa com todos numa sociedade diversa.
Para o professor bibliotecário quais são os principais recursos e fontes que reproduzem estereótipos? Para este diagnóstico ouviu a voz da diversidade de utilizadores da comunidade?
Como é que a agenda da biblioteca integra esta discussão, consciencialização e alargar de perspetivas, inclusive com outros atores fora da escola (a inclusão em educação é parte da inclusão social)?
Na vida diária da biblioteca como é que exprime, a cada criança ou jovem, a crença de que tem valor/ potencial e o sentimento de que pertence à comunidade? A construção de um sentido de comunidade é critério para seleção de ferramentas e atividades na internet?
Se “todos os professores devem estar preparados para ensinar todos os alunos” (8.ª recomendação da UNESCO), a educação inclusiva faz parte do seu desenvolvimento profissional? Na ação da biblioteca aplicou-a em que área e quais foram os seus resultados?
A Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência7 (2006; Artigo 24) e ODS das Nações Unidas reconhecem que a educação inclusiva é um direito (e dever moral), para além de melhorar a aprendizagem de todos. Cabe à biblioteca a criação de contextos que tenham em conta a diversidade de necessidades, percebendo a diferença como oportunidade para aprendermos e prosperarmos uns com os outros e juntos.
Referências
1. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). (2020a). Global Education Monitoring Report 2020: Inclusion and education - All means all. Paris: Autor. Disponível em: https://en.unesco.org/gem-report/report/2020/inclusion
2. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). (2020b). Relatório de monitoramento global da educação – resumo, 2020: Inclusão e educação: todos, sem exceção. Paris: Autor. Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000373721_por
3. Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO). (2020c). Sondagem: Inclusão e educação - Todos significa Todos. Paris: Autor. Disponível em: https://gem-report-2020.unesco.org/poll/
6. Conselho da Europa. (s. d.) Ensino de História: História e ensino de história têm sido o foco do trabalho do Conselho da Europa em educação desde o seu início. Estrasburgo: Autor. Disponível em: https://www.coe.int/en/web/history-teaching
Numa época em que o número de crianças e jovens com acesso à internet já se conta por muitos milhões em todo o mundo, não deixa de causar algum espanto pensarmos que esse número, efetivamente muito grande, corresponde afinal, apenas, a um terço da população mundial.
De facto, duas em cada três crianças ou jovens com menos de 25 anos não tem internet em casa.
A conclusão é de um estudo da UNICEF, realizado no final do ano passado, numa altura em que, por força da pandemia, o ensino a distância se tornou um imperativo, e a conectividade um bem de primeira necessidade. Afinal tão escasso.
O estudo cobre 87 países, espalhados por todas as regiões do globo, permitindo identificar assimetrias e discrepâncias.
Efetivamente, talvez mais impactante do que o valor global referido, são os valores regionais/ nacionais que estão por detrás dessa média aritmética. E esses revelam enormes contrastes: de um lado, os países com maior rendimento oferecem conectividade a cerca de 90 % das suas crianças e jovens; no outro extremo, os mais pobres ficam-se por uns confrangentes 6%. Entre uns e outros, os países de rendimento médio-alto andam em torno dos 50%.
Ironicamente, a média aritmética, sendo um indicador estatisticamente inquestionável, acaba, neste caso, por não corresponder à situação concreta de praticamente nenhum país. Quase todos estão muito acima ou muito abaixo.
Os investigadores da UNICEF quiseram levantar também, dentro de cada região, as diferenças entre zonas rurais e urbanas. Sem surpresa, foi identificado, em todos os países, um mais largo acesso à internet nas zonas urbanas do que nas rurais.
Mas essa diferença nunca é tão marcante como a que existe entre grupos de nações: nos países mais ricos, mesmo nas zonas rurais, a percentagem de jovens com acesso à internet é muito superior à das zonas urbanas dos países mais pobres.
Se começamos, talvez, por um instante de surpresa, este estudo vem, afinal, ao encontro do que já sabemos: a geografia do acesso à internet sobrepõe-se, sublinhando-a, à desigual distribuição dos (outros) bens essenciais, como medicamentos, segurança ou água.
O Plano Nacional de Formação Financeira, parceiro da RBE, associa-se, mais uma vez, à Global Money Week, que este ano decorre entre 22 e 28 de março.
Take care of yourself, take care of your Money (Cuida de ti, cuida do teu dinheiro) é o tema de 2021, associando a literacia financeira à resiliência e ao cuidado consigo próprio/a, tão importante nos tempos que vivemos.
As Bibliotecas Escolares são desafiadas a participar nesta iniciativa, através da dinamização de ações de educação e sensibilização financeira junto do/as aluno/as. Recursos e sugestões, com exemplos concretos, podem ser encontrados no site da Global Money Week.
As iniciativas a realizar serão divulgadas no portal Todos Contam (www.todoscontam.pt) através do preenchimento de um formulário disponível até ao dia 10 de março. As atividades nele descritas serão comunicadas à OCDE que, enquanto coordenadora mundial, fará um levantamento das iniciativas desenvolvidas em todos os países participantes.
O Oeiras Internet Challenge (OIC) é uma iniciativa promovida pelo Município de Oeiras, através das suas Bibliotecas Municipais, que consiste na realização de um torneio de pesquisa, seleção e avaliação de fontes de informação em linha. Dirigido à comunidade escolar do ensino secundário, visa o desenvolvimento de competências digitais e de literacia da informação.
Nesta edição, realizada em parceria com a Rede de Bibliotecas Escolares (RBE), o torneio em forma de quiz, com recurso ao software pedagógico Kahoot, é alargado a nível nacional. São destinatárias todas as Bibliotecas Escolares integradas na RBE, através da participação de alunos do ensino secundário.
Os conteúdos aos quais os participantes devem responder incidem sobre cultura geral, literacia digital, língua portuguesa e capitais europeias de cultura, em linha com a candidatura de Oeiras para 2027. As inscrições decorrem até 19 de março de 2021 em formulário próprio.