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Blogue RBE

Qui | 30.09.21

Leitura lateral

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Quando a tecnologia gerida por empresas privadas (Google, Facebook…), segundo aquilo que afirmam os próprios trabalhadores 1, ou por governos populistas (eleição de presidentes, Brexit…), pode destruir a confiança nas instituições e nas eleições, bem como comprometer liberdades e direitos individuais (e.g. tomada de decisões informadas), as literacias da leitura, informação e media são uma prioridade da escola.

No uso e ensino de tecnologia digital impõe-se uma mudança de paradigma: mais do que conhecer e usar novas ferramentas, é importante colocar-se na perspetiva de quem cria e vende tecnologia e perceber como esta funciona, manipula, torna dependente (FOMO) e infantiliza (narcisismo) a mente humana.

Em matéria de leitura, além de promover a leitura vertical, é necessário promover a leitura lateral.

A leitura vertical é aquela em que o utilizador não sai da página e lê de cima para baixo, clicando nas ligações que a página apresenta e, eventualmente, na secção ‘Sobre’.

A leitura lateral consiste em verificar o que se lê enquanto se lê, abrindo outros separadores e pesquisando noutras páginas e fontes não indicadas no texto, tais como: verificadores de notícias, Wikipedia, livros, revistas académicas, dissertações, blogues e media sociais.

Tal como trabalha o currículo em ligação ao contexto/ realidade dos alunos, de modo a torná-lo significativo e humanizá-lo, a biblioteca escolar trabalha a leitura construindo o contexto, a história e a estratégia de comunicação original da informação lida, lendo por detrás do texto, suas imagens e multimédia.

Esta é uma técnica fundamental para leitura em linha, cuja publicação não exige validação por parte de autoridade científica, apesar de, no apuramento da veracidade e confiança dos conteúdos, a distinção entre suportes de leitura ser irrelevante, já que é boa prática a combinação contínua de meios para traçar a rede de informação oculta por detrás do texto - só a leitura literária, por prazer, pode ser exceção ao comportamento investigativo do utilizador.

A tecnologia tem um poder avassalador, modificando a escrita, a leitura e o mundo. A internet democratizou o acesso à informação e abriu a torrente de desinformação: boatos com afirmações falsas, teorias da conspiração, fraudes.

A propagação de desinformação sempre foi muito mais rápida do que a de informação fidedigna, mas, com as redes sociais, esta velocidade atingiu uma escala sem precedentes, gerando descrédito nas instituições/ democracia, descriminação, ódio, polarização.

Para os cidadãos europeus a desinformação é motivo de preocupação: para 83% é uma ameaça à democracia, 51% dizem que foram expostos a desinformação na internet, 63% dos jovens têm a perceção que se deparam com notícias falsas mais de uma vez por semana.

Para criar um ambiente em linha mais transparente, seguro e fiável, a União Europeia, até final de 2021, compromete-se a reforçar o Código de Conduta sobre Desinformação, aplicável a plataformas e anunciantes e a aprovar legislação que estabeleça a transparência da propaganda política 2.

Em Portugal a Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital (Lei n.º 27/2021, de 17 de maio) 3 prevê direitos e liberdades dos cidadãos no ambiente digital: direito ao esquecimento (apagamento de dados pessoais); à proteção contra a geolocalização abusiva; ao desenvolvimento de competências digitais; à reunião, manifestação, associação; à participação; em caso de desinformação, direito à apresentação de queixa junto da Entidade Reguladora para a Comunicação Social.

As bibliotecas escolares trabalham estes direitos com as crianças e jovens e as comunidades para que a vida na internet possa ser fonte de desenvolvimento e realização, pessoal e coletiva.

 

Referências

1. Orlowski, J. (Dir.). (2020). The social dilemma. https://www.humanetech.com/the-social-dilemma

2. União Europeia. (2021). Reforçar o Código de Conduta da UE sobre Desinformação. https://ec.europa.eu/info/strategy/priorities-2019-2024/new-push-european-democracy/european-democracy-action-plan/strengthening-eu-code-practice-disinformation_pt

3. Assembleia da República. (2021, 17 de maio). Carta Portuguesa de Direitos Humanos na Era Digital. https://dre.pt/application/conteudo/163442504

 

Fonte da imagem: Sikkema, K. (2020). Unsplash. https://unsplash.com/photos/HHtzGcZkRZY

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Qui | 30.09.21

Ser escritor é cool

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O concurso “SER ESCRITOR É COOL!” é organizado pela Rede de Bibliotecas Escolares e tem como objetivos a promoção da leitura e da escrita, com recurso aos media, estando organizado em 4 escalões: 1.º, 2.º e 3.º ciclos e ensino secundário.

Ao longo do ano, são lançados vários desafios, cujas respostas podem ser apresentadas em diferentes formatos (texto, vídeo, podcast). Os concorrentes podem utilizar apenas um ou vários formatos, ao longo dos vários desafios. A escolha dos melhores trabalhos é feita pelo júri (75%) e pelo público (25%).

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Veja todos os pormenores no portal RBE.

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Qua | 29.09.21

Concurso Media@ção

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Lança-se mais uma edição do concurso Media@ção que, este ano, coloca à escolha dos concorrentes a abordagem de um dos três temas: relacionar os media com a liberdade de expressão; com a participação em termos de cidadania, na escola e/ou comunidade; pensar a relação entre diferentes media. Mais uma vez, partindo da vivência e dos usos e práticas mediáticas individuais.

O atual Regulamento salienta o facto de os alunos dos cursos EFA também concorrerem na categoria 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário, o que não era explícito nos anteriores. Estabelece, ainda, uma terceira categoria de trabalhos a concurso na qual serão agrupados, exclusivamente, os da autoria de alunos de cursos artísticos e especializados na área do audiovisual. Faz igualmente referência à desvalorização de trabalhos tipo Powerpoint animado ou construídos a partir de programas de animação automática.

Abrangendo o público estudantil desde o ensino básico ao ensino secundário, escolas públicas, privadas e profissionais e, ainda, escolas portuguesas ou de ensino do português no estrangeiro, o concurso Media@ção destina-se a todos os alunos que queiram refletir sobre a sua experiência de uso dos media e dar expressão à sua criatividade através de um vídeo, um podcast ou uma animação 2D, 3D ou stop motion!
A data limite para entrega dos trabalhos é o dia 5 de abril de 2022, não sendo necessária inscrição prévia.

Veja o regulamento no Portal RBE (https://www.rbe.mec.pt/np4/Mediaacao.html).

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Ter | 28.09.21

Centenário de Paulo Freire III: Estética e ética, componentes essenciais da aprendizagem

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Em setembro comemora-se o centenário de nascimento do humanista e pedagogo brasileiro Paulo Freire (19 de setembro de 1921 – 1997), fonte de inspiração quando se pensa a educação e a escola – e a biblioteca – em ligação a um propósito social, de libertação e emancipação, individual e coletivo, face à opressão/ autoritarismo e mentira/ desinformação.

Da experiência de educação de adultos ao Plano Nacional de Alfabetização, cuja implementação inicia em 1964 e à sua vasta obra, da qual se destaca Pedagogia do Oprimido, de 1974, há três ideias que destacamos porque podem ajudar à valorização da escola – e da biblioteca – na comunidade e à recuperação. Esta é a terceira publicação sobre este centenário e apresenta a terceira ideia.

“A alfabetização, portanto, é toda a pedagogia: aprender a ler é aprender a dizer a sua palavra. E a sua palavra humana imita a palavra divina: é criadora” 1.

O Programa Nacional de Alfabetização de Paulo Freire visa a transformação da sociedade através da educação popular, que trabalha com a pluralidade de pessoas - inclusive marginalizadas e silenciadas (“nunca são chamados de analfabetos mas de alfabetizandos” 2) - questões amplas sobre a sua vida, tais como: saúde, trabalho, ambiente e cultura.

Este modelo de educação inclusivo e participativo, que visa o bem viver e o reconhecimento social de todos, exige formas de escuta e expressão abrangentes e diversas.

O círculo de cultura é uma ferramenta pedagógica proposta por Freire, em que o coordenador, não o professor, integrando-se com o grupo de alunos, tem o papel de “propiciar condições favoráveis à dinâmica do grupo, reduzindo ao mínimo sua intervenção direta no curso do diálogo”. Reunindo com um máximo de vinte alunos, trabalha com eles temas que eles próprios sugerem e que, estando interligados, podem organizar-se em círculos concêntricos, do geral para o particular 3

Para incentivar o diálogo, o coordenador pode apresentar imagens sobre situações reais desafiadoras a respeito de palavras relevantes, de uso comum e carregadas de experiência vivida - “segundo esta pedagogia a palavra jamais pode ser vista como um ‘dado’ (ou como uma doação do educador ao educando) mas é sempre, e essencialmente, um tema de debate para todos os participantes do círculo de cultura. As palavras não existem independentemente de sua significação real, de sua referência às situações” 4.

Estas imagens “devem poder expressar algo deles próprios e, tanto quanto possível, seguindo suas próprias formas de expressão plástica de modo a que estes homens particulares e concretos se reconheçam a si próprios, no transcurso da discussão, como criadores de cultura” 5.

Sobre este reconhecimento de cada aprendente como sujeito de cultura (universo de criação humana), Freire testemunha: “Certa vez, uma alfabetizanda nordestina discutia, em seu círculo de cultura, uma codificação que representava um homem que, trabalhando o barro, criava com as mãos, um jarro. (…) Agora, ultrapassando a experiência sensorial, indo mais além dela, dava um passo fundamental: alcançava a capacidade de generalizar que caracteriza a ‘experiência escolar’. Criar o jarro como o trabalho transformador sobre o barro não era apenas a forma de sobreviver, mas também de fazer cultura, de fazer arte. Foi por isso que, relendo sua leitura anterior do mundo e dos que-fazeres no mundo, aquela alfabetizanda nordestina disse segura e orgulhosa: ‘Faço cultura. Faço isto’” 6.

Esta necessidade e direito humano de (re)criação, através das artes – e da brincadeira - de novas perspetivas, sensibilidades e sentimentos, é marca essencial da verdadeira aprendizagem e deve ser inteiramente livre e crítica: “Eu acho que teria sido melhor se eles [em vez de um modelo de gato dado pela professora] tivessem tido na sala um gato vivo, andando, correndo, pulando – disse Claudius. – As crianças desenhariam o gato como entendessem, como o percebessem. As crianças reinventariam o gato de verdade. Ficariam livres para fazer o gato que lhes aprouvesse. Seriam livres para criar, para inventar e reinventar“ 7

É uma abordagem ética, baseada no respeito pela liberdade/ autonomia dos alunos, que gera a sua intervenção estética que exprime uma crítica ao presente e anuncia um ideal, sonho/ utopia, desejo de transformação que é esperança - “espera na luta”, “esperançar” – de uma ética humanista.

 

No contexto da biblioteca escolar…

 

Desenvolvemos mecanismos de escuta dos alunos a respeito do currículo, das atividades, das relações, do que deve ser ensinar e aprender?

Quando dialogamos com os alunos sobre um livro ou obra de arte, tomamos como referência o modo como eles leem o mundo e situações concretas da sua vida?

Criamos contextos desafiantes para que eles possam partilhar, entre si e com a comunidade, os seus problemas sobre a realidade e realizar os seus sonhos éticos e estéticos?

 

Referências

1. Freire, P. (1970). Pedagogia do oprimido. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf

2. Freire, P. (1967). Educação como prática de liberdade https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/5.-Educa%C3%A7%C3%A3o-como-Pr%C3%A1tica-da-Liberdade.pdf

3. Freire, P. (1970). Pedagogia do oprimido. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf

4. Freire, P. (1967). Educação como prática de liberdade https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/5.-Educa%C3%A7%C3%A3o-como-Pr%C3%A1tica-da-Liberdade.pdf

5. Ibid.

6. Freire, P. (2001). Carta de Paulo Freire aos Professores. https://www.scielo.br/j/ea/a/QvgY7SD7XHW9gbW54RKWHcL/?lang=pt&format=pdf

7. Freire, P. (1997). Pedagogia da Esperança – Um reencontro com a Pedagogia do Oprimido. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/10.-Pedagogia-da-Esperan%C3%A7a.pdf

 

Fonte da imagem: “Mural de Paulo Freire na Faculdade de Educação e Humanidades da Universidade do Bío-Bío, Chile”. Wikipedia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire#/media/Ficheiro:Painel.Paulo.Freire.JPG

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Ter | 28.09.21

Ler e escrever mais com a biblioteca

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Esta candidatura da Rede de Bibliotecas Escolares, cuja apresentação decorre de 28 de setembro a 18 de outubro de 2021, visa apoiar projetos em que a biblioteca, em articulação com os docentes e mobilizando os recursos disponibilizados nesta iniciativa, assuma um papel ativo no desenvolvimento de competências de leitura e de escrita.

A Rede de Bibliotecas Escolares (RBE) convoca a biblioteca a realizar, com os professores titulares e/ou os conselhos de turma, um trabalho estruturado de diagnóstico, desenho e implementação de projetos de leitura e/ou de escrita, particularmente dirigidos aos alunos que evidenciem aprendizagens não consolidadas. Os roteiros Escola+ 21|23 Ler com a biblioteca e Diário de escritas com a biblioteca, inseridos no Plano 21I23, podem dar um contributo decisivo para a formulação destes projetos integrados.

Assumirão particular interesse os projetos que deem protagonismo a ações de carácter sistemático e planificadas em articulação com as áreas curriculares.

Veja toda a informação no portal RBE.

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Seg | 27.09.21

Concurso Eu digo não ao sexismo!

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Eu digo não ao sexismo! é um concurso destinado às alunas e aos alunos do 3.º ciclo do ensino básico e do ensino secundário das escolas públicas, privadas e profissionais do país, promovido conjuntamente pela PpDM (Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres) e pela CIG (Comissão para a Cidadania e Igualdade de Género) em colaboração com a RBE (Rede de Bibliotecas Escolares).

A iniciativa vem responder aos desafios lançados pelo Conselho da Europa (CoE) na sua Recomendação, de 2019, “Combater e prevenir o sexismo” que considera a educação escolar uma das 9 áreas estratégicas para prevenir e combater os comportamentos e discriminações sexistas que afetam raparigas/ mulheres, mas também rapazes/ homens.

As bibliotecas escolares são os pontos focais das escolas para este concurso e através delas a CIG e a PpDM irão realizar, no próximo dia 12 de outubro, uma ação de formação a distância de 3 horas, das 17 às 20 horas, acreditada, para docentes das escolas com interesse em trabalhar com as suas turmas para a participação neste concurso (inscrições). O objetivo da formação é dar a conhecer a primeira definição internacional de sexismo que esta Recomendação apresenta, bem como as ideias-chave que o CoE apresenta sobre as causas, manifestações e efeitos deste fenómeno, os principais contextos em que ele é vivenciado por raparigas/mulheres, bem como por rapazes/homens, e as propostas de ação para o prevenir. Pretende-se ainda divulgar a campanha do CoE Sexismo. Repara nele. Fala dele. Acaba com ele. É neste âmbito que o lançamento deste concurso constitui uma atividade do Projeto Europeu Mobiliza-te contra o Sexismo II, coordenado em Portugal pela PpDM.

Patrocinam este concurso a Auchan e a Xerox responsáveis pelos prémios a atribuir às equipas vencedoras.

De acordo com o Regulamento do concurso, que agora se divulga, as escolas terão de enviar até dia 24 de janeiro de 2022 (nova data de entrega de trabalhos) os vídeos produzidos pelas suas alunas e alunos e cuja duração não poderá exceder os 3 minutos, acompanhados do respetivo formulário, bem como da declaração de aluna/o e da declaração  de encarregada/o de educação. A cerimónia pública de entrega dos prémios está marcada para o dia 30 de março.

Mais informações, contacte através de concursovideonaosexismo@gmail.com.

#AcabaComOSexismo #StopSexism #MeToo

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Seg | 27.09.21

Mês Internacional da Biblioteca Escolar (MIBE)

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Outubro é o Mês Internacional da Biblioteca Escolar (MIBE), uma celebração anual das bibliotecas escolares em todo o mundo, uma oportunidade para darem a conhecer o trabalho que desenvolvem e mostrarem que não são apenas um serviço, mas um centro nevrálgico vital nas escolas. A chamada à ação é da IASL (International Association of School Librarianship).

Como habitualmente, a Rede de Bibliotecas Escolares lança um desafio às bibliotecas: Recriação artística de contos de fadas e contos tradicionais de todo o mundo, a qual pode assumir diferentes formas:

- dramatização;

- espetáculo musical;

- filme;

- desenho ou pintura;

- trabalho tridimensional;

- performance de leitura em voz alta.

Leia tudo sobre a iniciativa no Portal RBE (https://www.rbe.mec.pt/np4/MIBE.html).

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Sex | 24.09.21

Centenário de Paulo Freire II: A escola deve intervir na realidade

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Em setembro comemora-se o centenário de nascimento do humanista e pedagogo brasileiro Paulo Freire (19 de setembro de 1921 – 1997), fonte de inspiração quando se pensa a educação e a escola – e a biblioteca – em ligação a um propósito social, de libertação e emancipação, individual e coletivo, face à opressão/ autoritarismo e mentira/ desinformação.

Da experiência de educação de adultos ao Plano Nacional de Alfabetização, cuja implementação inicia em 1964 e à sua vasta obra, da qual se destaca Pedagogia do Oprimido, de 1974, há três ideias que destacamos porque podem ajudar à valorização da escola – e da biblioteca – na comunidade e à recuperação. Ontem, apresentamos uma dessas ideias, hoje, damos continuidade.

“Quero aprender a ler e a escrever”, disse uma analfabeta do Recife, ‘para deixar de ser sombra dos outros.’” 1

O modelo de educação contextualizado proposto por Paulo Freire, apresentado na publicação de ontem, é libertador porque incentiva a ação transformadora baseada na reflexão crítica (praxis) que visa a superação das formas de desumanização/ desigualdade e de manipulação/ alienação, bem como a emancipação/ autonomia e realização.

Na atualidade a disseminação de desinformação na internet, que põe em causa democracia, liberdades e saúde pública, faz com que os media seja um campo essencial de alfabetização e crítica. No contexto de utilização em massa da televisão, afirma Freire: “Como educadores e educadoras progressistas não apenas não podemos desconhecer a televisão mas devemos usá-la, sobretudo, discuti-la. Não temo parecer ingênuo ao insistir não ser possível pensar sequer em televisão sem ter em mente a questão da consciência crítica. É que pensar em televisão ou na mídia em geral nos põe o problema da comunicação, processo impossível de ser neutro. Na verdade, toda comunicação é comunicação de algo, feita de certa maneira em favor ou na defesa, sutil ou explícita, de algum ideal contra algo e contra alguém, nem sempre claramente referido2.

Porque incentiva e acelera a consciencialização e exercício de direitos e deveres, a equidade e justiça social, a escola contribui para o bem comum e possui um propósito político – “Ninguém pode estar no mundo e com os outros de forma neutra. Não posso estar no mundo de luvas nas mãos constatando apenas. A acomodação em mim é apenas caminho para a inserção, que implica decisão, escolha, intervenção na realidade” 3. Apresenta propostas pedagógicas cooperativas, que mobilizam parcerias adaptadas à vida dos alunos - famílias, autarquia, bibliotecas municipais e instituições culturais, outras escolas e universidades, organizações não governamentais, media e outras empresas – e que reforçam o seu envolvimento na sociedade (escola cidadã).

Na perspetiva freiriana o professor é um mediador que cria ambientes/ contextos em que todos se sentem acolhidos para participar, partilhando opiniões, inquietações, frustrações, desejos e esperanças. Mais do que dar respostas, o papel do professor é gerar questões/ dúvidas, propor desafios, provocando a curiosidade – “Como professor devo saber que sem a curiosidade que me move, que me inquieta, que me insere na busca, não aprendo nem ensino” 4 - e a necessidade de aprender – “Quando entro em uma sala de aula devo estar sendo um ser aberto a indagações, às perguntas dos alunos, a suas inibições; um ser crítico e inquiridor, inquieto em face da tarefa que tenho – a de ensinar e não a de transferir conhecimento” 5.  

 

Referências

1. Freire, P. (1967). Educação como prática de liberdade https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/5.-Educa%C3%A7%C3%A3o-como-Pr%C3%A1tica-da-Liberdade.pdf

2. Freire, P. (1996). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/9.-Pedagogia-da-Autonomia.pdf

3. Ibid.

4. Ibid.

5. Ibid.

 

Fonte da imagem: “Mural de Paulo Freire na Faculdade de Educação e Humanidades da Universidade do Bío-Bío, Chile”.Wikipedia, a enciclopédia livre. https://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire#/media/Ficheiro:Painel.Paulo.Freire.JPG

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Qui | 23.09.21

Centenário de Paulo Freire I: Ligação do conhecimento à vida e ao conhecimento prévio dos alunos

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Em setembro comemora-se o centenário de nascimento do humanista e pedagogo brasileiro Paulo Freire (19 de setembro de 1921 – 1997), fonte de inspiração quando se pensa a educação e a escola – e a biblioteca – em ligação a um propósito social, de libertação e emancipação, individual e coletivo, face à opressão/ autoritarismo e mentira/ desinformação.

Da experiência de educação de adultos ao Plano Nacional de Alfabetização, cuja implementação inicia em 1964 e à sua vasta obra, da qual se destaca Pedagogia do Oprimido, de 1974, há três ideias que destacamos porque podem ajudar à valorização da escola – e da biblioteca – na comunidade e à recuperação e que serão brevemente apresentadas em três publicações neste espaço.

“Para ser grande, sê inteiro: nada/ Teu exagera ou exclui./ Sê todo em cada coisa. Põe quanto és/ No mínimo que fazes./ Assim em cada lago a lua toda/ Brilha, porque alta vive.” 1

Nas abordagens de educação popular em Angicos, Rio Grande do Norte (1962), feitas sem cartilha, Paulo Freire e colegas educadores estabelecem uma relação de proximidade, respeito e afetividade com seus alunos. Através de encontros informais, inteiram-se e apropriam-se das suas histórias, saberes e valores, bem como do vocabulário específico de cada grupo - "cana", "enxada", "terra", “água”, "colheita" para turma de cortadores de cana-de-açúcar - e identificam os seus problemas e sonhos/ utopias.

Na sequência dos trabalhos de David Ausubel sobre aprendizagem significativa, Paulo Freire defende que aprendemos a partir de relações:

- Consigo próprio;

- Com os outros e, por isso, “Neste lugar de encontro, não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos: há homens que, em comunhão, buscam saber mais” 2. Defende que “Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender” (“do-discência – docência-discência”) 3. Distancia-se, assim, de uma perspetiva elitista/ académica e especializada/ fragmentada de ensino e de um modelo tecnocrático de aulas com conteúdos pré-elaborados/ gravados, dirigidos a um elevado número de alunos e que se expandiu com o confinamento (conceito "bancário" da educação);

- Com o mundo: o educador precisa de aprofundar e alargar a leitura do mundo que os grupos de alunos com quem trabalha fazem a partir do seu contexto local: a “’leitura do mundo’ que precede sempre a ‘leitura da palavra’”4.

A ligação permanente ao mundo e aos outros alimenta a curiosidade, alarga os interesses, promove a vontade de aprender para e ao longo da vida e reforça vínculos/ laços entre a comunidade, promovendo a interculturalidade e o enraizamento.

A aprendizagem gera-se a partir do contacto com a realidade e no coletivo e faz-se com base no diálogo que exige saber escutar e silenciar, disponibilidade de abertura e aceitação do outro nas suas diferenças. O verdadeiro diálogo com os alunos começa quando o professor se interroga sobre o que vai dialogar com eles, inquietando-se sobre a matéria do diálogo que deve ser planeada com eles, na base da sua participação ativa e democrática 5. Quem aprende constrói um sentido pessoal e vivo do currículo e contribui para o currículo da escola.

Ao mesmo tempo que situa os alunos no seu contexto, estabelece a ligação deles com o mundo, levando-os a tomar consciência, questionarem, pesquisarem e desenvolverem uma atitude crítica sobre o seu dia-a-dia, a sociedade e o ambiente e a construírem uma visão global/ sistémica do mundo que ligue os saberes e vivências e lhes permita compreender a complexidade.

 

Referências

1. Pessoa, F. (1933). Arquivo Pessoa: Odes de Ricardo Reis. http://arquivopessoa.net/textos/503

2. Freire, P. (1970). Pedagogia do oprimido. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf

3. Freire, P. (1996). Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/9.-Pedagogia-da-Autonomia.pdf

4. Ibid.

5. “Capítulo 3. O diálogo começa na busca do conteúdo programático”. Freire, P. (1970). Pedagogia do oprimido. https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/10/Pedagogia-do-Oprimido-Paulo-Freire.pdf

6. Freire, P. (1967). Educação como prática de liberdade https://cpers.com.br/wp-content/uploads/2019/09/5.-Educa%C3%A7%C3%A3o-como-Pr%C3%A1tica-da-Liberdade.pdf

 

Fonte da imagem: Instituto Paulo Freire. https://www.paulofreire.org/

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