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Ter | 27.02.24

UNESCO: Novo quadro para a cultura 2024 e o papel das bibliotecas

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1. A necessidade de um novo Quadro Global da UNESCO

O Quadro para a Cultura e a Educação Artística/Framework for Culture and Arts Education atual da UNESCO baseia-se em 2 documentos: o Roteiro para a Educação Artística (Lisboa, 2006) e a Agenda de Seul: Objetivos para o Desenvolvimento da Educação Artística (Seul, 2010) [2].

O crescimento da mobilidade humana, das desigualdades, das alterações climáticas e da transformação digital transformou o contexto em que estes documentos foram aprovados.  As recomendações da iniciativa Futuros da Educação 2021 [3] - e a Declaração MONDIACULT 2022 - reforçam a importância da ligação da cultura à educação e a necessidade desta revisão.

Considerando a importância da cultura e da educação para todos os setores e para o desenvolvimento sustentável, os Estados-Membros da UNESCO solicitaram, em 2021, a sua revisão, de forma a adaptá-los às exigências do mundo atual e futuro.

Em janeiro de 2024 a UNESCO publica o primeiro Rascunho/Draft do futuro Quadro [4].

2. Quais são as novidades do futuro Quadro?

A.

Mantém a definição alargada de cultura da Declaração Mondialcult 2022, que inclui processos, como o diálogo intercultural e valores, como a diversidade cultural e linguística:

Cultura é o “conjunto de características distintivas espirituais, materiais, intelectuais e emocionais que caracterizam uma sociedade ou um grupo social, inclui não só artes e letras, mas também modos de vida, direitos fundamentais do ser humano, sistemas de valores, tradições e crenças" e “pode ser transmitida, expressa e vivida” através de palavras, som, imagens, movimento, monumentos e objetos, meios digitais e conhecimentos tradicionais.

Reconhece que “A cultura está no centro do que nos torna humanos e constitui a base dos nossos valores, escolhas e das nossas relações uns com os outros e com a natureza, dotando-nos de pensamento crítico, de um sentido de identidade e da capacidade de respeitar e aceitar o outro”, desenvolvendo a imaginação, a autoexpressão e a curiosidade sobre todos os assuntos.

Nos termos deste Rascunho, a cultura é um ecossistema que reflete a transformação digital, devendo incluir património, indústrias culturais e criativas e que deve integrar-se, de forma significativa e prática, em todas as formas de educação, incluindo não formal, ao longo da vida, técnica e profissional.

B.

Reforça a ligação indissociável entre cultura e educação: a educação é um meio importante para a promoção da cultura, da criatividade e da inovação e a cultura melhora e alarga as competências e os resultados da aprendizagem. Esta interligação reforça/acelera:

- A “aprendizagem holística, incluindo a aprendizagem social e emocional, a sensibilidade ao ambiente natural, bem como promover o diálogo intercultural, a cooperação e a compreensão, fundamentais para enfrentar de forma sustentável os desafios globais e os processos de transformação” [4];

- A equidade e a relevância da educação, pois a diversidade das expressões culturais “enriquecem e revitalizam a educação, oferecendo a diversos aprendentes, em particular aos que pertencem a grupos vulneráveis e desfavorecidos, os meios para exprimirem a sua humanidade e acederem a uma diversidade de formas de expressão, formas de pensar, conhecer e ser, histórias e línguas de povos e comunidades, que dão sentido à sua leitura do mundo, aumentam a sua autoconfiança e motivação, e, consequentemente, o seu sucesso na aprendizagem” e sustentam e alargam comunidades de aprendizagem, criadas inclusive de forma espontânea/informal [4];

- O desenvolvimento sustentável, designadamente ao nível do ODS 4, educação de qualidade inclusiva e equitativa, promovendo oportunidades ao longo da vida para todos e do ODS 8, promoção de emprego e o trabalho digno para todos. O futuro Quadro afirma que a cultura e a educação artística “deve ser holística, transformadora e impactante”, ter efeitos concretos na realidade.

C.

Deve ser ancorada em 6 princípios, como:

- “Afirmar a cultura e a educação artística como um bem público global da humanidade” que promove o bem-estar e deve ser acessível a todos.

- Ser baseada nos direitos humanos e na diversidade, devendo abordar e combater estereótipos e preconceitos discriminatório.

- Facilitar a cocriação e a participação ativa e significativa de todos os intervenientes e beneficiários, designadamente dos jovens.

Refira-se que foi a Carta de Roma 2020, liderada pela United Cities and Local Governments (UCLG) [hiperligação ao artigo anterior], que estabelece o direito de todos participarem na cultura e de que este é “condição para uma sociedade melhor”. Este foi um compromisso assinado por 49 cidades europeias e Lisboa foi uma das cidades que o subscreveu. Considera que a “cultura é tudo o que fazemos além da mera sobrevivência, dá sentido às nossas perceções, une a humanidade através das emoções, imaginação, pensamentos”, é "um recurso comum e renovável no qual nos encontramos uns com os outros, aprendemos o que nos pode unir e como lidar com as diferenças num espaço partilhado".

- “Promover a aprendizagem ao longo da vida e em toda a vida numa diversidade de cenários e ambientes”.

D.

Apela ao reforço do papel da cultura nas 3 áreas que a implementam:

- Políticas e legislação dos governos;

- Educação - ambientes e experiências de aprendizagem, formação de professores e de educadores, diálogo e cooperação com agentes da cultura;

- Sociedade - tecnologias digitais e inteligência artificial, parcerias e coordenação interinstitucional, investigação, avaliação/monitorização e recolha de dados para fundamentar as políticas e advocacia no setor.

3. Qual é o papel das bibliotecas no futuro Quadro?

A IFLA (International Federation of Library Associations and Institutions) apela ao envolvimento das bibliotecas no apoio à implementação do Quadro da UNESCO [6], que atribui às artes e à cultura um papel fundamental no currículo e na sociedade.  

Quais podem ser as modalidades deste apoio das bibliotecas?

- Recolha, análise e monitorização de dados concretos;

- Partilha de progressos/desafios, impactos e boas práticas;

- Identificação de parceiros, como a UNESCO;

- Realização de eventos ou recursos no âmbito do 70.º aniversário da Convenção de Haia de 1954 para a Proteção dos Bens Culturais em Caso de Conflito Armado, como o da Ucrânia ou israelo-palestiniano;

- Estabelecer uma parceria significativa com uma organização da sociedade civil para implementar a Convenção da UNESCO de 2005 sobre Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais [7] e, segundo a IFLA, “Considerar dar especial atenção a iniciativas que fortaleçam a diversidade de expressões culturais no ambiente digital” ou no desenvolvimento sustentável. Portugal, um dos 152 países que ratificou – ou aderiu - à Convenção, será um dos 132 países que apresentará, em 2024, o seu relatório periódico quadrienal [8].

Atenta à realidade das crianças e jovens e ao alargamento das formas, conteúdos e alcance da aprendizagem, a Rede de Bibliotecas Escolares disponibiliza Propostas de Trabalho dinamizadas no terreno que podem constituir boas práticas de aprendizagem com artes e património e através da iniciativa A de Acolher contribui com recursos e atividades que visam a defesa do património em caso de conflitos armados. Estas iniciativas utilizam ferramentas digitais e contribuem para uma cultura digital mais diversa e inclusiva.

A título conclusivo, refira-se que o Rascunho para o novo Quadro Global da UNESCO foi elaborado no contexto do Projeto Zero do Quadro para a Cultura e a Educação Artística, lançado pela UNESCO após a Cimeira Transformar a Educação e foi adotado pelos Ministros da Cultura e da Educação de todo o mundo na Conferência Mundial da UNESCO sobre Cultura e Educação Artística que se realizou de 13 a 15 de fevereiro de 2024 em Abu Dhabi, Emirados Árabes Unidos. Em 2025 irá realizar-se a Conferência Mundial sobre Políticas Culturais e Desenvolvimento Sustentável.

 

Referências

  1. (2024). Conferência Mundial sobre Cultura e Educação Artística 2024: Todas as etapas | Um Quadro para a Cultura e a Educação Artística. https://www.unesco.org/en/frameworkcultureartseducation
  2. (2010). Seoul Agenda:Goals for the Development of Arts Education. https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000190692?posInSet=1&queryId=ca75f9c8-47f6-441a-8f28-1cceb366ddc9
  3. Sobre a iniciativa da UNESCO, Futuros da Educação (2021):
  1. (2024). Draft 1 UNESCO Framework for Culture and Arts Education. https://www.unesco.org/sites/default/files/medias/fichiers/2024/01/Draft%201_UNESCO%20Framework%20for%20Culture%20and%20Arts%20Education_EN_0.pdf
  2. UCLG, Roma Capitale & Azienda Speciale Palaexpo. (2020). The Rome Charter. https://www.2020romecharter.org/pagine/about-eng
  3. IFLA (2024). Get Involved with Cultural Policy and Advocacy in 2024. https://www.ifla.org/news/get-involved-with-cultural-policy-and-advocacy-in-2024/
  4. (2005). Convenção sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais. https://www.unesco.org/en/legal-affairs/convention-protection-and-promotion-diversity-cultural-expressions
  5. (2024). Diversidade de Expressões Culturais: Relatórios Periódicos Quadrienais. https://www.unesco.org/creativity/en/policy-and-monitoring/periodic-reports#submit-your-countrys-quadrennial-periodic-report-
  6. 📷 Imagem criada com https://www.fotor.com/

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