UN: COP29 - Em solidariedade por um Mundo Verde
"O nosso mundo está a ficar mais quente e mais perigoso. E isto não é uma questão de debate. É uma questão de facto. Acabámos de ter o dia mais quente, os meses mais quentes, os anos mais quentes e a década mais quente da história".
António Guterres, UN, 2024b.
De 11 a 22 de novembro de 2024 decorreu, em Baku, Azerbaijão, a 29ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29).
1. Porque é a COP29 importante para as bibliotecas escolares?
- A IFLA, cuja orientações a RBE adota/participa, é parceira das Nações Unidas (e da Rede de Bibliotecas Escolares) e participa nesta (e nas anteriores) COP para:
- Apresentar um relatório sobre os progressos da ACE (Action for Climate Empowerment/ Ação para o Empoderamento Climático), no qual sublinha “explicitamente o papel das bibliotecas na promoção da ação climática”, defendendo que desempenham “um papel crítico na consciencialização pública e na educação das comunidades sobre as mudanças climáticas, fornecendo acesso a conhecimentos e recursos” (IFLA, 2024);
- Copatrocinar um evento com membros da Climate Heritage Network/Rede de Património Climático, como o ICOMOS, para o qual contribui com a comunicação O papel da cultura e do património na construção dos valores e atitudes necessárias à ação climática. Este evento vai ao encontro da ideia da UNESCO e da IFLA de que a cultura deve constituir um ODS autónomo da Agenda Pós 2030;
- Reforçar a ligação das bibliotecas às universidades e bibliotecas universitárias para que alarguem e aprofundem a criação e o acesso ao conhecimento sobre a crise e a ação climática (IFLA, 2024).
A IFLA – e as bibliotecas escolares – trabalham os aspetos educativos e culturais da GGA (Global Goal on Adaptation/Meta Global de Adaptação), i.e., da Mudança Climática/Climate Change, visando o empoderamento climático dos seus profissionais e das crianças e jovens.
- A UNESCO, cujas orientações servem de guia aos bibliotecários e educadores de todo o mundo, considera a COP, evento no qual participa ativamente, uma oportunidade para:
- Defender o papel fundamental da Greening Education Partnership/Parceria para uma Educação Ecológica na melhoria dos níveis de literacia climática e na aceleração da ação climática;
- Reforçar a inclusão da educação verde nas NDC (Contribuições Nacionalmente Determinadas) dos países, implementando-a – crianças e jovens e educadores são catalisadores da mudança;
- Aumentar o financiamento na educação climática (UNESCO, 2024).
2. Qual é a agenda da COP29?
Visa acelerar ações concretas e alcançar um compromisso financeiro ambicioso para responder ao aumento dos efeitos das mudanças climáticas porque:
- O aumento da crise climática não está a ser acompanhados por um aumento de financiamento;
- Os países em desenvolvimento, os mais afetados pela crise climática - segundo Selwin Hart, Conselheiro Especial do Secretário-Geral, representam dois terços da população mundial - não têm financiamento suficiente para se adaptarem aos efeitos das mudanças climáticas e fazerem a sua transição para economias de carbono zero, pelo que é necessário que o financiamento climático, pelos países mais ricos que, na corrida pelo próprio desenvolvimento, provocaram esta crise, se concentre na redução de emissões e na compensação de perdas e danos (UN, 2024c).
Para que os países de baixa renda – os mais afetados pela crise climática - não sejam deixados para trás, Selwin Hart desafia o G20, grupo de países com as maiores economias do mundo e responsáveis por 80% das emissões globais, a apresentarem um compromisso financeiro ambicioso que garanta que o aumento da temperatura não ultrapassa os 1,5 graus do Acordo de Paris (UN, 2024c).
A COP29 também é uma oportunidade para os 196 países do Acordo de Paris apresentarem os seus planos nacionais para 2035, as NDC, que deverão ser entregues no início de 2025.
Hart refere ainda a importância do envolvimento democrático e da cooperação de todas as partes na discussão sobre o clima: “se fossem apenas os grandes a discutir a política climática, provavelmente nunca teríamos atingido o objetivo de 1,5 graus do Acordo de Paris [que] (…) foi uma meta proposta pela primeira vez pelos membros mais pequenos da família internacional [a ONU] que dá voz aos que não têm poder” (UN, 2024c).
3. O que é o financiamento de perdas e danos?
Criado na COP27, o Fundo de Perdas e Danos destina-se a apoiar os países mais afetados pela crise climática. Segundo o Secretário-Geral das NU, António Guterres, os 700 milhões de dólares de capital inicial previsto no âmbito da COP29 não é suficiente: "700 milhões de dólares é aproximadamente o salário anual dos 10 futebolistas mais bem pagos do mundo" e “não representa sequer um quarto dos danos causados no Vietname pelo furacão Yagi, em setembro”, refere.
4. Quanto dinheiro será necessário?
Só o aumento da ambição sobre o NCQG (Novo Objetivo Coletivo Quantificado) para o financiamento climático, fixado em 100 mil milhões dólares por ano, permite construir resiliência climática para todos (República Portuguesa, 2024).
5. Em que ponto estamos no Acordo de Paris (1,5º até 2030)?
O último relatório das NU, Emissions Gap Report 2024: No more hot air… please!, elaborado pelos principais cientistas climáticos mundiais, prevê, até finais deste século, um aquecimento global de 3,1°C, se mantivermos os atuais níveis de emissões e as CNR das nações não assumirem compromissos mais ambiciosos.
O relatório deixa uma mensagem de esperança: “Continua a ser tecnicamente possível entrar numa trajetória de 1,5°C, com a energia solar, a energia eólica e as florestas a serem verdadeiras promessas de cortes rápidos e abrangentes nas emissões” (UN Environment Programme, 2024).
E, por isso, a COP29 deve ser
“uma plataforma de lançamento para aumentar a ambição e garantir que os novos CDN se comprometem coletivamente reduzir quase para metade as emissões de gases com efeito de estufa até 2030. Em seguida, devem cumprir rapidamente os compromissos, com base nas ações tomadas” (UN Environment Programme, 2024).
6. Qual é o ponto de situação de Portugal e da UE?
Portugal tem
“um Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC) revisto e mais ambicioso, com metas de aumento do peso das renováveis no consumo final da energia dos 47% para os 51% e uma meta de redução das emissões de 55%, face aos valores de 2005. O PNEC alinha a sua trajetória no sentido chegar à neutralidade climática até 2045” (República Portuguesa, 2024).
A UE lidera a ação climática sendo responsável por apenas 6% das emissões globais (European Commission, 2024).
7. Porque é que a COP29 é controversa?
- O Azerbaijão é um petro-Estado: 90% das suas exportações são combustíveis fósseis e a Socar, sua empresa de gás e petróleo, anunciou que quer expandir a sua perfuração de petróleo e gás (EuroNews, 2024).
- A 24 de outubro o Parlamento Europeu aprovou uma Resolução Conjunta sobre a situação no Azerbaijão, na qual condena “os abusos contínuos dos direitos humanos no Azerbaijão são incompatíveis com a realização da COP29 (…) pedindo a libertação incondicional de todas as pessoas arbitrariamente detidas ou presas por conta de suas opiniões políticas” e recomenda que as COP “não sejam realizadas em países com um histórico desfavorável em direitos humanos” (Parlamento Europeu, 2024).
- Greta Thunberg, líder do movimento global Fridays For Futur/Greve Climática Estudantil, num artigo para o The Guardian, escreve:
“Durante a rápida escalada das crises climáticas e humanitárias, outro petro-Estado autoritário e sem respeito pelos direitos humanos acolhe a COP29 […] as COP provaram ser conferências de greenwashing que legitimam as falhas dos países em garantir um mundo e um futuro habitáveis e também permitem que regimes autoritários como o Azerbaijão e os dois anfitriões anteriores — Emirados Árabes Unidos e Egito — continuassem violando os direitos humanos” (2024).
O anfitrião da COP designou-a COP da Paz, o que é “de cortar o coração, para dizer o mínimo, falar de paz global após as terríveis violações de direitos humanos cometidas pelo regime Aliyev do Azerbaijão contra arménios étnicos que vivem na região de Nagorno-Karabakh/Artsakh” (Thunberg, 2024). - A Amnistia Internacional afirma que
“a grave situação dos direitos humanos no Azerbaijão piorou desde que o país foi anunciado como anfitrião da COP29 em dezembro de 2023. As autoridades alegam que estão ‘garantindo que as vozes de todos sejam ouvidas’ na cimeira - mas processaram mais de uma dúzia de ativistas e jornalistas este ano e silenciaram vozes importantes sobre a crise climática”.
Apela, entre outros aspetos, para que
Os direitos humanos estejam no centro de todas as decisões sobre ações climáticas;
Os Estados em condições de o fazer aumentem maciçamente o financiamento climático e o financiamento para perdas e danos;
Todos os estados se comprometam a eliminar totalmente os combustíveis fósseis, de forma rápida e justa. - Em Portugal, a Quercus, Organização Não Governamental de Ambiente, informa em Comunicado de 11 de novembro, que “escolheu não se deslocar para mais uma conferência onde as ações essenciais já são conhecidas, mas raramente executadas com coragem”. Realizar a COP “em mais um país produtor de petróleo é um indicador de que teremos fracas perspetivas” e considera “desconcertante” participar numa COP num país onde os direitos humanos são “sistematicamente violados e as vozes críticas silenciadas”.
Outros artigos sobre COP
- UN: COP28 e o papel das bibliotecas
- UNESCO: O Primeiro Currículo e Norma de Qualidade para Escolas Verdes
- COP 27: Empoderamento climático, o reforço do papel das bibliotecas
- COP27 – Compromisso com as pessoas e o planeta
Referências
- EuroNews. (2024). Delegação do Parlamento Europeu à COP29 receberá telefones descartáveis como medida de segurança. EuroNews. https://www.euronews.com/my-europe/2024/10/31/european-parliament-delegation-to-cop29-to-receive-burner-phones-as-security-measure
- European Commission. (2024). Unindo forças rumo à COP29 para uma ação global ambiciosa. https://climate.ec.europa.eu/news-your-voice/news/joining-forces-road-cop29-ambitious-global-action-2024-11-12_en
- IFLA. (2024, 8 nov.). IFLA at the UN Climate Change Conference COP29: What’s on the Agenda? https://www.ifla.org/news/ifla-at-the-un-climate-change-conference-cop29-whats-on-the-agenda/
- Parlamento Europeu. (2024). PROPOSTA DE RESOLUÇÃO CONJUNTA sobre a situação no Azerbaijão, a violação dos direitos humanos e do direito internacional e as relações com a Arménia. https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/RC-10-2024-0133_EN.html
- Quercus. (2024). Comunicado. Instagram. https://www.instagram.com/quercus_ancn_/p/DCO9_EsMGOr/?img_index=1
- República Portuguesa. (2024). Portugal na COP29: ambição climática e cooperação internacional. https://www.portugal.gov.pt/pt/gc24/comunicacao/noticia?i=portugal-na-cop29-ambicao-climatica-e-cooperacao-internacional
- Thunberg, G. (2024). A ‘Cop of peace’? How can authoritarian, human rights-trashing Azerbaijan possibly host that? https://www.theguardian.com/commentisfree/2024/nov/11/greta-thunberg-cop29-authoritarian-human-rights-azerbaijan-greenwashing
- UN. (2024a). Will COP29 deliver the trillions needed to halt the man-made climate crisis? https://news.un.org/en/audio/2024/11/1157011
- UN. (2024b, 12 nov.). COP29: Guterres pede mais ambição climática. https://unric.org/pt/cop29-guterres-pede-mais-ambicao-climatica/
- 📷 Will COP29 deliver the trillions needed to halt the man-made climate crisis?
UN. (2024c). The 1.5°C Climate Goal: Why Global Unity Matters. https://www.youtube.com/watch?v=aIdeM3Da6Rk
UNESCO. (2024). Climate change education at COP29. https://www.unesco.org/en/climate-change/education/cop29
UN Environment Programme. (2024, 24 out,). Emissions Gap Report 2024. https://www.unep.org/resources/emissions-gap-report-2024