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Blogue RBE

Seg | 08.09.25

Renovar compromissos para enfrentar novos desafios

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Manifesto da IFLA-UNESCO 2025 para as Bibliotecas Escolares

A Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias (International Federation of Library Associations and Institutions – IFLA) tem-se afirmado, desde a sua fundação em 1927, como a mais influente organização mundial no domínio das bibliotecas, da ciência da informação e dos serviços de documentação. Ao longo das últimas décadas, a sua ação, em estreita articulação com a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), tem-se traduzido na formulação de manifestos e declarações que constituem marcos de referência incontornáveis. 

A publicação, em junho de 2025, do novo Manifesto para as Bibliotecas Escolares representa um momento de particular relevância, quer pela atualização que introduz face ao texto de 1999, quer pelo enquadramento que oferece num tempo em que as transformações digitais, as tecnologias emergentes e as mudanças sociais e culturais colocam novos desafios à educação. Este documento apresenta-se, pois, como um guia de ação, reiterando princípios e compromissos com a equidade, a liberdade intelectual e o acesso universal à informação, ao mesmo tempo que reconhece a centralidade da biblioteca escolar como espaço de inovação pedagógica e de formação de cidadãos globais.

Um novo Manifesto para novos tempos

O Manifesto da IFLA-UNESCO de 2025 inscreve-se numa tradição que remonta a 1999, quando foi publicado o primeiro texto orientador, aprovado pela UNESCO e amplamente divulgado pela Rede de Bibliotecas Escolares (RBE). Ambos os documentos partilham princípios estruturantes, porém o mais recente evidencia mudanças que refletem os desafios de uma sociedade profundamente transformada em pouco mais de duas décadas.

Em 1999, sublinhava-se a importância de fomentar a literacia da informação e o gosto pela leitura numa sociedade em transição para o digital. Passadas mais de duas décadas, o Manifesto de 2025 descreve um ecossistema informacional em permanente mutação, no qual a biblioteca escolar deve garantir acesso físico e virtual, curadoria em múltiplos formatos e mediação crítica face às tecnologias emergentes, incluindo a inteligência artificial (IA). Por isso, o novo texto vai além da ênfase inicial, ao colocar a biblioteca no centro do desenvolvimento de literacias múltiplas (informacional, digital, mediática e em IA), fundamentais para a formação de cidadãos críticos, criativos e responsáveis.

O papel do professor bibliotecário também é redefinido. Em 1999, destacava-se a sua responsabilidade pela gestão da biblioteca e apoio pedagógico; em 2025,  afirma-se como líder educativo e especialista em informação, com intervenção no codesenho de experiências de aprendizagem, no desenvolvimento profissional docente e na articulação com redes locais e internacionais.

Ademais, a centralidade da biblioteca na estratégia da escola surge agora mais vincada: se em 1999 se destacava o seu papel de apoio ao currículo, o Manifesto de 2025 evidencia a sua função transversal, que deve ser explicitada nos documentos institucionais e assumida pela gestão escolar. Outro avanço significativo é a integração da biblioteca na estratégia da escola.

O princípio da igualdade de acesso, já presente em 1999, é agora considerado do ponto de vista da equidade: não basta oferecer serviços iguais a todos, é necessário adotar medidas específicas para responder às necessidades de diferentes públicos, garantindo inclusão plena.

Também no plano político e financeiro se regista um reforço: de um apelo à existência de meios adequados em 1999, passa-se, em 2025, à exigência de apoio legislativo, político e financeiro sustentado, que assegure recursos, tecnologias, profissionais qualificados e formação contínua, reconhecendo a biblioteca escolar como pilar das estratégias educativas e culturais.

Finalmente, a leitura, núcleo identitário das bibliotecas, é reinterpretada. O manifesto anterior valorizava a criação do hábito e do prazer de ler; o de 2025 propõe práticas diversificadas  (leitura recreativa, em voz alta, partilhada, voluntária), colocando a experiência leitora ao serviço da imaginação, do conhecimento e da cidadania.

Em síntese, a mais recente versão do Manifesto amplia e atualiza o legado de 1999, respondendo às exigências de um presente em que a biblioteca escolar é, simultaneamente, espaço de tradição e de inovação, de preservação da memória e de abertura ao futuro.

Do global ao local: o Manifesto e a Rede de Bibliotecas Escolares

Em Portugal, a publicação do Manifesto de 2025 encontra terreno fértil. A Rede de Bibliotecas Escolares (RBE) é membro oficial da IFLA desde 2022, reforçando a sua inserção nas dinâmicas internacionais e beneficiando da proximidade aos debates globais sobre o futuro das bibliotecas. Este vínculo confere à RBE uma dupla valência: a afirmação de uma rede nacional consolidada, com quase três décadas de experiência, e a integração numa comunidade internacional que partilha valores e estratégias comuns. 

De facto, muitos dos princípios reafirmados no novo Manifesto já estão presentes nos documentos orientadores da RBE: a aposta na literacia da leitura, da informação e dos media; a valorização do professor bibliotecário como mediador cultural e pedagógico; a integração da biblioteca na estratégia educativa das escolas; e a defesa do direito de todos os alunos a serviços de qualidade em condições de equidade. 

Ao garantirem acesso equitativo à informação, à cultura e às tecnologias, as bibliotecas escolares afirmam-se como instrumentos decisivos para a concretização do ODS 4, promovendo uma educação inclusiva, de qualidade e orientada para a aprendizagem ao longo da vida.

Este alinhamento traduz-se em práticas concretas: incorporação de tecnologias digitais nas práticas pedagógica, trabalho em rede com bibliotecas públicas e municipais, promoção da leitura em múltiplas modalidades e atenção à diversidade cultural e social. 

Assim, o Manifesto não só oferece enquadramento global como reforça, também, a legitimidade das políticas seguidas em Portugal no que às bibliotecas escolares diz respeito, sublinhando a importância de sustentar o seu trabalhocom financiamento adequado, formação contínua e reconhecimento institucional.

Um Manifesto que convoca

Em suma, o Manifesto da IFLA-UNESCO de 2025 sublinha que a biblioteca escolar não é somente um espaço físico com recursos, mas uma visão de futuro alicerçada no acesso equitativo à informação, na promoção da leitura e no desenvolvimento das literacias como direitos fundamentais de todas as crianças e jovens.

Em Portugal, a RBE tem concretizado esta visão em práticas consistentes. O novo Manifesto surge, assim, como atualização e reforço desses princípios, projetando novos horizontes e responsabilidades. Mais do que um texto normativo, o documento da UNESCO constitui uma convocação para consolidar compromissos e para uma integração plena da biblioteca escolar na estratégia educativa das instituições.

Enquanto guia de ação, o Manifesto interpela decisores políticos, direções escolares e profissionais da educação a criarem condições que assegurem à biblioteca escolar o seu papel estruturante na qualidade educativa. Portanto, a relevância da biblioteca estende-se para além do campo biblioteconómico, sendo fundamental no modelo de sociedade que se pretende construir: mais crítica, mais informada e mais democrática.

Em síntese, o Manifesto de 2025 deve ser entendido como texto fundador e mobilizador, capaz de orientar políticas e inspirar práticas, projetando a biblioteca escolar como lugar insubstituível de literacia, cidadania e futuro.


Referências

  1. Federação Internacional de Associações de Bibliotecários e de Bibliotecas. (1999). Manifesto da biblioteca escolar (Tradução do Gabinete da Rede de Bibliotecas Escolares). Ministério da Educação. https://www.rbe.mec.pt/np4/%7B$clientServletPath%7D/?newsId=3278&fileName=Manifesto para_a_Biblioteca_Escolar.pdf
  2. Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias & UNESCO (2025, 4 de junho). Manifesto da biblioteca escolar da IFLA-UNESCO 2025 [PDF]. International Federation of Library Associations and Institutions. https://repository.ifla.org/items/c9f90a1b-dcb7-4c16-a11c-30b53b7b333d (Tradução do Gabinete da Rede de Bibliotecas Escolares, Ministério da Educação, Ciência e Inovação).
  3. Federação Internacional de Associações e Instituições Bibliotecárias & UNESCO (2025).  Manifesto da biblioteca escolar da IFLA-UNESCO 2025 [PDF]. International Federation of Library Associations and Institutions. https://www.rbe.mec.pt/np4/%7B$clientServletPath%7D/?newsId=3278&fileName=IFLA_School_Library_Manifesto_2025_poste1.pdf (Tradução do Gabinete da Rede de Bibliotecas Escolares, Ministério da Educação, Ciência e Inovação).
  4. Fundação Biblioteca Nacional. (2024, 1 de outubro). IFLA - PAC (Centros de Preservação e Conservação). Diretório de Preservação - Internacional. https://www.gov.br/bn/pt-br/atuacao/processamento-e-preservacao/diretorio-de-preservacao-pasta/internacional/ifla-pac-lac
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