Oportunidades e riscos das redes sociais
Integrada no FOLIO Educa, a ação de formação “Tertúlias Literárias Dialógicas” responde, transversalmente, às necessidades de formação dos educadores e docentes das diversas áreas do conhecimento, centrando-se na promoção e mediação da leitura e das literacias, com enfoque no papel das bibliotecas escolares enquanto recurso central de trabalho interdisciplinar e colaborativo nas escolas. Todos os anos, as “Tertúlias Literárias Dialógicas” estruturam-se em torno do tema geral do Festival Internacional Literário de Óbidos, sendo o tema desta edição o “Risco”.
Este ano, o programa integrou as quatro tertúlias abaixo apresentadas:
- - 13 de outubro - Oportunidades e riscos das redes sociais - Sara Pereira
- - 16 de outubro - Crianças em risco? - Eduardo Sá
- - 18 de outubro - A ética na Inteligência Artificial: desafios - Martinha Piteira e Manuela Aparício
- - 20 de outubro - Dreamshaper - João Pedro Borges
Trata-se de um programa alinhado com as prioridades definidas pela RBE para 2023-2024 [1], com vista a desenvolver, aperfeiçoar e consolidar dinâmicas que respondam aos imperativos atuais, exigindo que as bibliotecas se desenvolvam do ponto de vista digital e contribuam para esse movimento ao nível da escola, nas várias dimensões da sua ação. É preciso um trabalho diário concertado para desenvolver competências de leitura e de escrita, essenciais a toda a aprendizagem, e competências digitais, de informação e media, para garantir uma participação efetiva na sociedade.
A abrir o ciclo de tertúlias, Sara Pereira, professora do Instituto de Ciências Sociais e investigadora do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS), da Universidade do Minho, retomou algumas das ideias centrais da obra da sua autoria Crianças, jovens e media na era digital: Consumidores e Produtores? [2]
Hoje, as crianças e os jovens têm uma relação bastante (inter)ativa com os media, são simultaneamente consumidores e produtores de conteúdos, surgindo os conceitos de “prosumers” ou “produsers”.
Foi Alvin Toffler [3] quem introduziu o termo “prosumer” (prosumidor) no início dos anos 80, caracterizando-o como "um esbatimento progressivo da linha que separa o produtor do consumidor" (Toffler, 1984, p. 267). Depois da Primeira Vaga (da sociedade agrícola, quando a maior parte das pessoas consumia o que produzia), veio a Segunda Vaga (da revolução industrial, quando a sociedade separou estas duas funções, criando a distinção entre consumidor e produtor) e estamos, atualmente, na Terceira Vaga (era da informação e da comunicação), em que os novos estilos de vida são baseados metade na produção para troca, metade na produção para uso.
Tendo em conta esta realidade, Sara Pereira, considerando o público em idade escolar, levantou duas questões com que interpelou os presentes:
📍 Nas plataformas digitais, estaremos a produzir e a participar mais? E estaremos a comunicar melhor?
📍 A nossa participação salda-se, sobretudo, em “pequenos atos de envolvimento” ou numa cultura verdadeiramente participativa?
Segundo a oradora, os dados provenientes de vários estudos empíricos revelam que as práticas mediáticas de crianças e jovens estão mais orientadas para o consumo do que para a produção e, ainda, que as vias para a participação nem sempre têm por detrás princípios de expressão e de cidadania.
O projeto Transmedia Literacy. Exploiting transmedia skills and informal learning strategies to improve formal education [4] revela que os adolescentes portugueses são mais consumidores do que produtores. Mesmo os que produzem reveem-se mais como consumidores, sentindo-se mais confortáveis nesse papel. As suas produções mais regulares são fotos e vídeos curtos e as práticas mais comuns passam por partilhar conteúdos com os amigos, ver as publicações de outros, observar e seguir o fluxo de conteúdos. Estas práticas são mais frequentes do que publicar conteúdos originais, por isso as suas produções traduzem-se em "pequenos atos de envolvimento”, na sua grande maioria informais, espontâneas pouco estruturadas, não planeadas e de curto alcance. As motivações por detrás dessas produções são o entretenimento e a diversão.
Face a essas conclusões, a oradora defendeu que temos de ultrapassar a tendência de olhar a relação dos jovens com os meios digitais sob o prisma de risco e de segurança. Os medos, receios, preocupações e dúvidas que as plataformas digitais e as redes sociais levantam reforçam os argumentos protecionistas e de segurança, de que resulta uma preocupação com os perigos e os riscos, preocupação essa que se sobrepõe às oportunidades e aos desafios que esses meios podem proporcionar.
Por isso, depois de largo debate em que também estiveram em questão o uso de telemóveis nas escolas e o uso de ferramentas de inteligência artificial generativa, ficou lançado o desafio de apostar numa pedagogia capacitadora que “desenvolva conhecimentos, atitudes e competências de pensamento e ação críticas para habitar o ecossistema informativo e mediático” em que vivemos, de modo a que as crianças e jovens possam retirar desse ecossistema máximo proveito para as suas vidas e o seu bem-estar. Afinal, assegurar o bem-estar não implica, somente, salvaguardar a sua segurança, mas antes permitir-lhes que possam compreender e participar no mundo online com segurança e respeito.
A fechar a sessão, ficou a ideia de que, num ambiente mediático rico e diversificado, há que formar públicos exigentes, críticos e participativos, o que aponta para a necessidade urgente de apostar na literacia mediática como uma competência fundamental do século XXI e um direito de todas as crianças e jovens. O projeto bYou – Estudo das vivências e expressões de crianças e jovens sobre os media [5], de que a RBE é parceira, encoraja práticas mediáticas reflexivas e críticas, numa perspetiva de Literacia para os Media e é, apenas, uma das muitas ações possíveis que urge desenvolver.
Notas
[1] Ver mais em https://www.rbe.mec.pt/np4/Prioridades.html
[2] Pereira, S. (2021). Crianças, jovens e media na era digital: Consumidores e Produtores?. UMinho Editora/Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade. https://doi.org/10.21814/uminho.ed.45
[3] Tofler, A. (1984). A Terceira Vaga. Livros do Brasil.
[4] Projeto financiado pela União Europeia no âmbito do programa Horizonte 2020 e que envolveu a participação de oito países, entre eles Portugal, através da Universidade do Minho, com coordenação de Sara Pereira. Mais informação em https://transmedialiteracy.org/
[5] Aceder ao site do projeto- https://www.byou.ics.uminho.pt/