Onde se irão meter os lagartos?
A literatura tem o poder de tocar o coração, a consciência e a vontade do ser humano
O Antropoceno, termo cunhado por Paul Crutzen e Eugene Stoermer (2020), marca uma mudança abrupta e irreversível na rede de vida natural de que o ser humano é parte.
Corresponde à era dos humanos, marcada pelo aquecimento global, poluição atmosférica, contaminação da água e acidificação dos oceanos e extinção de espécies de seres vivos, numa escala sem precedentes que agravará as desigualdades sociais e colocará em perigo a sobrevivência do ser humano na Terra.
O século XX e XXI produziu a clivagem ser humano - natureza, mas não conseguiu criar a mudança de mentalidade necessária para responder aos seus efeitos.
Relatórios científicos, como os da Plataforma de Política Científica Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistémicos das Nações Unidas, informam e alertam para o perigo crescente de futuras doenças e pandemias, mais mortíferas que a Covid-19, derivadas da destruição do sistema terrestre e da globalização.
Não obstante a sua gravidade, as evidências e previsões científicas não têm sido suficientes para gerar a mudança do sistema político e económico de consumo, tributação e saúde.
É necessária a ação dos cidadãos, destacando-se o movimento cívico das crianças e jovens que, há poucos anos, conseguiu colocar na agenda política mundial as questões climáticas e ambientais, embora com reduzidas consequências práticas.
A cultura e as artes, designadamente a literatura, também têm um papel a desempenhar nesta mudança porque têm o poder de tocar fundo no coração, consciência e vontade do ser humano, suscitando o questionamento e a reflexão e impulsionando vozes e caminhos de reparação.
Neste contexto, durante as comemorações do Centenário de José Saramago, a Rede de Bibliotecas Escolares apresentou para publicação na Revista de Letras da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro - número de dezembro de 2022, dedicado ao Centenário de nascimento de José Saramago (1922-2022 - o artigo, que pode ser lido na fonte [1].
Porquê o livro As Pequenas Memórias?
José Saramago é lido e trabalhado com todas as bibliotecas escolares, pela profundidade e universalidade de ideias e sentimentos expressos nos seus textos e porque, através deles, eleva, expande e imortaliza a língua portuguesa.
Por entre a sua vasta obra, As pequenas memórias [2] são um livro autobiográfico que pode ser lido com diversos leitores de diversos níveis de maturidade e que pode constituir uma primeira aproximação à literatura.
Possibilita ainda uma abordagem interdisciplinar que articula Humanidades, Ciências, Economia e Educação para a Cidadania, conforme se compreende pela estrutura do referido artigo:
1. Nova abordagem dos direitos humanos
2. Nova abordagem do sensível
3. A sabedoria de quem vive – e morre – humanamente
4. O desligamento do sensível e a perda de humanidade
5. Mudar tudo
A Cátedra José Saramago em Portugal
A Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, em ligação à Fundação José Saramago e à Livraria Lello, criou, a 5 de novembro de 2021, a primeira - e única, em território nacional - Cátedra José Saramago.
Segundo o convénio da sua constituição, é “um espaço de pensamento, diálogo e realização conjunta e participada de atividades, que tem como ponto de partida o estudo e a divulgação da língua, da literatura e da cultura portuguesas”, a partir da obra do Nobel da Literatura [3].
José Saramago “Não foi à Universidade nunca” e “viveu toda a vida com a mágoa de não ter ido à Universidade”, apesar do valor dos seus textos para os estudos académicos de universidades em todo o mundo e para a memória coletiva, sublinha Pilar del Rio na cerimónia de constituição da Cátedra [4].
A Cátedra visa a valorização e o crescimento sustentável da paisagem, das pessoas e das atividades económicas e culturais da região, bem como o envolvimento da “comunidade adulta como dos mais jovens e das crianças, das famílias, das escolas e das autarquias”, nas palavras do Reitor da UTAD, Emídio Gomes [5].
Carlos Nogueira, editor da Revista de Letras da Universidade e elemento de ligação à Rede de Bibliotecas Escolares, é regente desta Cátedra e diretor científico da Cátedra José Saramago da Universidade de Vigo (Espanha), bem como vencedor do Prémio Vergílio Ferreira 2022 com a obra José Saramago: a Literatura e o Mal e do Prémio Jacinto do Prado Coelho 2019 com o livro Resposta a Ítalo Calvino: Clássicos da Literatura, editado pela Livraria Lello.
Outras fontes sobre José Saramago:
Porque é necessário ler José Saramago?
A informação objetiva é uma impossibilidade
Outras fontes sobre a crise climática:
A Hora do Planeta: Água e Alterações Climáticas
Educação climática e ambiental
Ação climática - “E se começássemos apenas com uma canção?”
Referências
1. O artigo:
Silva, Liliana [Rede de Bibliotecas Escolares]. “Onde se irão meter os lagartos? Uma abordagem ecológica d’As pequenas memórias”, in: Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. (2022, dez.). Revista de Letras: Centenário de J. Saramago [série III, n.º 5, pp. 69-78]. Vila Real: UTAD. https://revistadeletras.utad.pt/index.php/revistadeletras/article/view/306/153
A revista integral:
Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. (2022, dez.). Revista de Letras: Centenário de José Saramago. Vila Real: UTAD. https://revistadeletras.utad.pt/index.php/revistadeletras/issue/view/23
2. Saramago, José. (2014). As pequenas memórias (4.ª ed.). Porto: Porto Editora.
3. Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. (2021, 5 nov.). UTAD vai ser a “catedral” de Saramago. Vila Real: UTAD. https://noticias.utad.pt/blog/2021/11/05/catedral-saramago/
4. Ibidem.
5. Ibidem.
Fonte da imagem: Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. (2022, dez.). Revista de Letras: Centenário de José Saramago. Vila Real: UTAD. https://revistadeletras.utad.pt/index.php/revistadeletras/issue/view/23