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Blogue RBE

Qui | 09.01.25

O desafio do "brain rot", a palavra eleita pela Oxford em 2024

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A expressão "brain rot", frequentemente usada para descrever a deterioração do estado mental ou intelectual, resultante do consumo excessivo de conteúdos digitais superficiais, destaca um fenómeno preocupante na sociedade contemporânea. Este conceito tem ganhado relevância, sobretudo entre os jovens, devido à exposição constante a estímulos rápidos e efémeros proporcionados pelas redes sociais e plataformas digitais (Carr, 2020).

Neste contexto, a escola assume um papel essencial no desenvolvimento de competências críticas e na promoção de hábitos de aprendizagem que combatam esta deterioração cognitiva.

O "brain rot" manifesta-se pela diminuição progressiva da capacidade de concentração, pelo enfraquecimento do pensamento crítico e pela preferência por conteúdos instantâneos e simplificados. Este uso intensivo de meios digitais afeta significativamente funções cognitivas essenciais, incluindo a memória, a compreensão textual e a capacidade de leitura profunda (Wolf, 2018). Estudos sugerem que, em contextos educativos, estes efeitos são amplificados, tornando urgente uma abordagem pedagógica inovadora e adaptada à realidade digital (Bavelier et al., 2010).

O papel transformador da escola e a importância das bibliotecas escolares

A escola tem a missão fundamental de implementar estratégias inovadoras que consigam evitar esta deterioração cognitiva, nomeadamente através da criação de projetos multidisciplinares, que devem assentar em quatro eixos fundamentais.

1. O desenvolvimento do pensamento crítico constitui o primeiro pilar. Num mundo onde a informação é abundante, mas frequentemente superficial, a capacidade de análise, reflexão e questionamento torna-se crucial. Os projetos multidisciplinares, ao estabelecerem relações entre diferentes áreas do saber, ajudam os alunos a desenvolver uma compreensão mais profunda e contextualizada do conhecimento. Nestes projetos, os alunos devem ser protagonistas do seu próprio processo educativo, pois só assim se estimula o raciocínio e a capacidade de resolução de problemas.

2. O fomento da leitura e da escrita representa o segundo eixo estratégico. A leitura aprofundada de textos literários desenvolve a capacidade de concentração prolongada e a compreensão de narrativas complexas, contrastando com o consumo fragmentado de informação característico das redes sociais. Através de programas de leitura extensiva, os alunos mergulham em obras que expandem os seus horizontes e estimulam a imaginação. A escrita, por sua vez, desenvolve nos alunos a capacidade de estruturar pensamentos, articular ideias e expressar-se com clareza e originalidade.

3. A literacia da informação e dos media é o terceiro pilar. Numa era de desinformação e sobrecarga informativa, a capacidade de avaliar criticamente as fontes e discernir informação credível torna-se uma competência vital. A utilização ética da informação cultiva a responsabilidade e o respeito pela propriedade intelectual, contribuindo para um uso mais consciente e crítico dos recursos digitais.

4. Por fim, a integração pedagógica da tecnologia completa esta abordagem multidisciplinar. Em vez de um consumo passivo e potencialmente prejudicial das tecnologias digitais, promove-se a sua utilização criativa e construtiva. Através do desenvolvimento de projetos digitais significativos os alunos deixam de ser meros consumidores para se transformarem em criadores de conteúdos. Esta abordagem fomenta uma relação mais saudável e produtiva com a tecnologia, sendo as ferramentas digitais utilizadas como meios de expressão, aprendizagem e resolução de problemas, em vez de meros instrumentos de entretenimento passivo. 
 
A biblioteca escolar como centro de inovação pedagógica

As bibliotecas escolares assumem um papel determinante na implementação destes projetos multidisciplinares, destacando-se como verdadeiros centros de inovação pedagógica (IFLA, 2015) que contribuem para a promoção de aprendizagens significativas. A sua atuação estratégica desdobra-se em várias dimensões interligadas, que se reforçam mutuamente para criar um ambiente de aprendizagem rico e estimulante.

Os programas de promoção da leitura, que caracterizam o dia-a-dia das bibliotecas escolares portuguesas, criam experiências literárias verdadeiramente transformadoras, fomentando comunidades de aprendizagem onde os alunos desenvolvem não apenas a compreensão literária, mas também competências sociais e emocionais através do diálogo e da partilha de interpretações.

A formação em literacia informacional e mediática é, também, uma área de trabalho crucial das bibliotecas escolares. Os programas estruturados nesta área não se limitam a ensinar técnicas de pesquisa, desenvolvendo um conjunto integrado de competências que permitem aos alunos avaliar criticamente a informação, compreender a sua relevância e utilizá-la de forma ética e eficaz.

O desenvolvimento criterioso das coleções é também uma das áreas a considerar. A biblioteca deve oferecer um acervo diversificado e cuidadosamente curado que responda às necessidades cognitivas e aos interesses dos diferentes níveis de ensino. A criação de núcleos temáticos alinhados com o currículo permite estabelecer pontes naturais entre os conteúdos programáticos e recursos complementares que aprofundam e enriquecem a aprendizagem.

A integração efetiva da biblioteca no currículo escolar representa o elemento catalisador que potencia todas estas dimensões. A planificação colaborativa entre os professores bibliotecários e os docentes das várias áreas curriculares cria sinergias que enriquecem o processo de ensino e de aprendizagem.

O combate à deterioração cognitiva - “brain rot” - exige, assim, uma abordagem sistémica que mobilize toda a comunidade educativa. O desenvolvimento de programas estruturados de literacia, a articulação efetiva entre a biblioteca escolar e o currículo e a criação de ambientes de aprendizagem estimulantes constituem pilares fundamentais desta estratégia. O sucesso desta abordagem educativa depende do compromisso coletivo na construção de uma escola que promova o desenvolvimento de mentes ágeis, críticas e preparadas para os desafios contemporâneos
 
Referências Bibliográficas

  1. Bavelier, D., Green, C. S., & Dye, M. W. G. (2010). Children, wired: For better and for worse. Neuron, 67(5), 692-701. https://doi.org/10.1016/j.neuron.2010.08.035
  2. Carr, N. (2020). The shallows: What the internet is doing to our brains. W. W. Norton & Company.
  3. International Federation of Library Associations and Institutions (IFLA). (2015). IFLA school library guidelines (2nd ed.). IFLA Publications Series No. 165. https://www.ifla.org/wp-content/uploads/2019/05/assets/school-libraries-resource-centers/publications/ifla-school-library-guidelines.pdf
  4. Oxford University Press. (2024). Brain rot named Oxford Word of the Year 2024.Oxford University Presshttps://corp.oup.com/news/brain-rot-named-oxford-word-of-the-year-2024/ 
  5. Wolf, M. (2018). Reader, come home: The reading brain in a digital world. Harper Collins. 
  6. Fonte da imagem: https://lexica.art/prompt/befe3669-dce7-4104-9d7a-8ca439d05fcd 

 

 

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