IFLA: Direitos Culturais
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Para preparar a Conferência Mundial sobre Políticas Culturais e Desenvolvimento Sustentável, Mondiacult 2022, a UNESCO convidou diversas entidades, incluindo a IFLA, para realizar encontros ResiliArt x Mondiacult que, devendo escutar diversas vozes e perspetivas, servirão para informar a Mondiacult [1] que decorrerá, de 28 a 30 de setembro, no México.
ResiliArt x Mondiacult: Bibliotecas que permitem um acesso inclusivo e significativo à cultura promovido pela IFLA [2], a 23 de fevereiro, discutiu o ponto de vista da biblioteca para o papel da cultura nos desafios globais.
Do encontro, a IFLA destaca 6 prioridades e 8 recomendações, dirigidas à sociedade civil e formuladores de políticas.
Prioridades
1. Ligações Cultura-Educação
É necessário “fortalecer os vínculos cultura-educação”, desenvolvendo parcerias com o setor da cultura e promovendo uma abordagem formal e informal da educação porque os currículos devem ser significativos, acessíveis e inclusivos, devem estimular a criatividade, cidadania global, identidade cultural e diálogo entre culturas.
2. Inclusão
É necessária uma política cultural que garanta que todos têm oportunidade de participar na vida cultural usando a sua linguagem.
A propósito, a Rede de Bibliotecas Escolares sublinha a importância de pôr em prática os princípios da IFLA/ UNESCO sobre A Biblioteca Multicultural [3] que assentam no pressuposto que a língua não pode ser fator de discriminação e que as bibliotecas devem fornecer informação, materiais, serviços e colaboradores que reflitam as necessidades e culturas de todos os leitores. Na Década Internacional das Línguas Indígenas (2022-2032) recorda ainda a importância do património linguístico do povo indígena.
A abertura da biblioteca a todas as culturas, não significa cair num relativismo cultural, pois deve ser feita no respeito por todos os outros direitos humanos.
3. Conectividade digital
As bibliotecas devem garantir que todos tenham acesso à internet e oportunidades para desenvolver competências digitais adaptadas às suas necessidades e devem criar e providenciar recursos à distância relevantes.
4. Lei de direitos autorais
Faz parte da promoção do acesso à educação e cultura, trabalhar com os utilizadores os aspetos legais dos direitos de autor, devendo a biblioteca “promover a adoção de práticas abertas na produção e partilha de conhecimento”, bem como facilitar a produção e transferência de livros adaptados a pessoas cegas ou com baixa visão, como prevê o Tratado de Marrakesh.
5. Património digital
Para que as bibliotecas possam preservar e tornar acessíveis as suas coleções, os responsáveis pela definição de políticas devem garantir que a digitalização, preservação e acesso a e-books, obras de arte e património cultural se mantém acessível, interoperável e pode ser usado para fins públicos, como educação e investigação. A preservação digital deve ser incentivada porque permite conservação a longo prazo e acesso sem restrições.
6. Exclusão digital
A biblioteca escolar deve trabalhar a exclusão digital – que inclui dificuldades de conectividade, acesso e criação de conteúdos e de competências – para garantir a participação e acesso equitativo à cultura digital.
Porque “A UNESCO estava particularmente interessada em receber recomendações de mecanismos que permitam que o património/ criatividade aproveite a transição digital e as novas tecnologias”, a IFLA estabelece as seguintes orientações para formuladores de políticas:
A. Criação integrada e coesa de planos nacionais de conectividade digital, que devem incluir as bibliotecas;
B. Parcerias público-privadas – por exemplo, com empresas de telecomunicações - para conectividade;
C. Eventos virtuais podem aumentar participação e facilitar serviços de tradução;
D. Enfrentar desafios legais para permitir acesso ao património cultural em ambiente digital.
Considerando que - sobretudo em período de pós-pandemia - parte significativa da nossa vida é feita em ambiente em linha, que em Portugal e outros países a legislação é anterior a este avanço tecnológico da sociedade - em Portugal a lei é de 1985 - e que há necessidade de tratamento justo dos direitos de autor, a IFLA considera que há que tornar a legislação menos restritiva e complexa e mais flexível para facilitar acesso equitativo à educação e cultura e que se deve caminhar para uma regulamentação global e justa para todos.
Para que as bibliotecas possam viabilizar o acesso ao património cultural em ambiente digital, é necessário criar um mecanismo legal que lhes permita “fazer cópias e divulgar o conhecimento contido nas suas coleções”, bem como dialogar e envolver os criadores nas decisões sobre partilha e uso desse material – as bibliotecas estão ligadas aos criadores e suas comunidades e devem ter “um papel maior na promoção e acesso” às suas criações.
E. Responder à falta de diversidade na expressão cultural na internet, garantindo que seja multicultural e multilingue e reflexo da sociedade cosmopolita em que vivemos – “Deve haver um mecanismo em vigor na criação de conteúdo digital e seleção de material digital para preservação a longo prazo que garanta que o progresso tecnológico sirva o plurilinguismo”.
7. Melhorar a infraestrutura cultural
“Para que comunidades diversas possam exercer equitativamente seu direito à cultura”, as bibliotecas devem ser os centros culturais da comunidade, disponibilizando em acesso livre exposições, conferências, programas de atividades artísticas e culturais. Para reforçar este papel carecem de maior investimento e apoio.
Recomendações
1. A política pública deve seguir uma abordagem em direitos humanos e os direitos culturais devem ser transversais porque transmitem valores e contribuem para realização dos demais direitos.
2. A biblioteca deve gerar oportunidades de aprendizagem não formal e de trocas equitativas de saber e cultura entre todas as pessoas.
3. Atividades virtuais podem diminuir discrepâncias entre comunidades urbanas e rurais e permitir o acesso a pessoas e comunidades marginalizadas, mas o acesso físico à cultura deve ser garantido – o virtual não substitui o presencial.
4. Inclusão e acesso equitativo devem ser integrados no quotidiano de todas as organizações, instituições, estruturas e serviços.
5. “Políticas focadas em dados” e dados acessíveis, interoperáveis e abertos para investigação e interesse público, bem como capacitação para preservação de material cultural em todas as áreas (audiovisual, digitalizado, material digital).
6. “Os profissionais da biblioteca devem estar entre os atores envolvidos na elaboração e implementação de planos nacionais de educação, participação cultural e inclusão digital.”
7. São necessários estudos sobre o impacto da cultura no desenvolvimento sustentável (ambiente, igualdade de género, racismo e discriminação, democracia, paz…) para que o seu valor “seja reconhecido e compreendido pelos formuladores de políticas”.
8. Oportunidades de formação profissional continua para os profissionais de biblioteca, especificamente para desafios emergentes para que “as bibliotecas possam fornecer serviços adequados que respondam às necessidades em evolução de suas comunidades.”
A IFLA apresentou estas prioridades e recomendações junto da UNESCO que deverão ser tidas em consideração na agenda da próxima Conferência Mundial sobre Políticas Culturais e Desenvolvimento Sustentável.
Referências
1. UNESCO. (2022). Mondialcult 2022. México: UNESCO. https://www.unesco.org/en/mondiacult2022
2. IFLA. (2022, 12 Apr.). ResiliArt x Mondiacult: Library Voices Joining the Global Conversation on Cultural Rights. Netherlands: IFLA. https://www.ifla.org/news/resiliart-x-mondiacult-library-voices-joining-the-global-conversation-on-cultural-rights/
3. IFLA & UNESCO. (2001). The Multicultural Library – a gateway to a cultural diverse society in dialogue. Netherlands: IFLA. https://repository.ifla.org/bitstream/123456789/731/1/multicultural_library_manifesto-en.pdf
4. Fonte da imagem: IFLA. (2022, 16 Fev.). ResiliArt x Mondiacult at IFLA – Meet the Panel and Register Now! Netherlands: IFLA. https://www.ifla.org/news/resiliart-x-mondiacult-at-ifla-meet-the-panel-and-register-now/