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Blogue RBE

Qui | 15.05.25

IFLA: Declaração sobre Direitos de Autor e Inteligência Artificial

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Objetivos

A Declaração da IFLA sobre Direitos de Autor [Copyright] e Inteligência Artificial (IA) [1] é um documento estratégico que visa apoiar as bibliotecas membros da IFLA “na abordagem de questões de direitos de autor relacionadas com o uso de IA e desenvolvimento de programas e serviços bibliotecários relevantes”. 

Elaborada pelo Comité Consultivo da IFLA sobre Direitos de Autor e outras Questões Legais, em colaboração com o Grupo de Interesse Especial da IFLA sobre IA e outros, é fundamental num contexto de integração crescente de IA nas práticas bibliotecárias.

Contextualização: lei de direitos de autor e inovação das bibliotecas

Leis de direitos autorais: 

  • Regulam a maneira como a informação é acedida, partilhada e criada;
  • Têm um papel importante na decisão de como os modelos de IA são treinados e podem ser utilizados [2].

A Declaração da IFLA reconhece o papel inovador das bibliotecas, destacando que estão numa posição única para liderar a adoção e utilização ética de IA e sublinha que podem ser pioneiras a vários níveis:

  1. Apoio ao treino de IA, disponibilizando repositórios abertos com dados e conteúdos para treino de modelos linguísticos, por exemplo adaptados a contextos locais;

  2. Inclusão de conteúdos gerados por IA nas coleções - por exemplo, criação de sistemas de recomendação bibliográfica baseados em IA;

  3. Utilização de IA para gestão automatizada de coleções digitais, catalogação, descoberta de coleções e melhoria da eficiência de serviços essenciais, como referência e empréstimo entre bibliotecas. 

Desafios e respostas

  • Limitação do uso de obras com direitos de autor 

O avanço de IA comporta desafios significativos, especialmente devido à crescente tendência dos titulares de direitos de autor em limitar:

  • O uso de conteúdos para treino de modelos de IA;
  • Exceções que permitam o acesso livre à informação. 

Estas restrições afetam a missão das bibliotecas. 

Em muitos países, a legislação de direitos de autor evoluiu para acomodar as novas tecnologias, respondendo “às preocupações legítimas dos criadores, incluindo as bibliotecas no seu papel de criadoras de processos e serviços baseados em IA. No entanto, este não é o caso em todos os países”, persistindo desigualdades legais que podem dificultar a inovação nas bibliotecas (A, B, C).  

  • Outros desafios

A IFLA sublinha que muitos desafios sobre IA vão além dos direitos de autor, abrangendo questões de ética, privacidade, segurança e impacto ambiental. Nestes casos, recomenda que as bibliotecas procurem orientação em fontes de políticas apropriadas.

Recomendações para bibliotecas

  • IA orientada por valores

A IFLA defende que a adoção ou recomendação de ferramentas de IA pelas bibliotecas deve ser guiada por valores:

As bibliotecas devem considerar implementar ou recomendar, aos utilizadores, ferramentas de IA com uma abordagem orientada por valores (values-driven approach). Por exemplo, as ferramentas de IA não devem comprometer a liberdade de expressão, a privacidade ou outras áreas de preocupação (como os impactos ambientais e as limitações da ação humana).

  • Alargamento das exceções aos direitos de autor

Apela à “promoção de limitações e exceções que permitam a extração de texto e de dados (text and data mining) de conteúdos legitimamente adquiridos ou acedidos, bem como o acesso a conjuntos de dados tão vastos quanto possível como defesa contra preconceitos e erros” [3]. 

  • Coleções para IA respeitando os princípios FAIR e CARE

As bibliotecas podem contribuir para este objetivo preparando coleções para a IA com licenças adequadas e respeitando os princípios FAIR (Findable, Accessible, Interoperable, Reusable) e CARE (Collective Benefit, Authority to Control, Responsibility, Ethics), que promovem um uso ético, transparente e equitativo da informação, especialmente no que respeita a dados de comunidades sub-representadas.

Esta abordagem deve ser acompanhada pela “monitorização contínua dos serviços de IA nas bibliotecas, para garantir a diversidade e o acesso equitativo à informação”.

  • Literacia em IA

O documento também defende que as bibliotecas devem ter papel ativo na promoção da literacia em IA, capacitando utilizadores e profissionais para compreenderem, questionarem e utilizarem ferramentas de IA de forma informada e crítica.

Recomendações para os Governos

Até agora o debate tem-se centrado entre os sectores dos direitos de autor e as grandes empresas de IA, não deixando espaço para se concentrar nas prioridades das bibliotecas: dar acesso à informação, à educação, à investigação e à participação cultural.

O documento apela a uma ação colaborativa de governos, empresas de IA e titulares de direitos, recomendando que:

  • Governos e empresas disponibilizem recursos para apoiar repositórios e infraestruturas de dados;

  • Titulares de direitos e fornecedores não imponham cláusulas contratuais que limitem indevidamente o uso de IA pelas bibliotecas ou impeçam o exercício de exceções legais:

“Detentores de direitos e comerciantes não devem incluir nos contratos uma linguagem que dificulte ou restrinja indevidamente a utilização da IA pelos utilizadores das bibliotecas ou que impeça a utilização de quaisquer exceções aplicáveis na legislação de direitos de autor”.

A declaração refere iniciativas internacionais que a IFLA apoia, como a ICOLC Statement on AI Licensing, que promovem uma abordagem colaborativa e ética, equilibrando os interesses de autores, fornecedores, utilizadores e bibliotecas, e defendendo o acesso aberto e equitativo à informação.

Conclusão

A Declaração da IFLA reforça o papel das bibliotecas como instituições centrais na promoção da literacia, inclusão digital e desenvolvimento ético da IA

Ao defender uma abordagem baseada em valores, a IFLA posiciona as bibliotecas como agentes de inovação e inclusão, capazes de liderar a integração responsável da IA na sociedade, sem comprometer o acesso ao conhecimento e direitos fundamentais. 

Diferenciando-se de abordagens estritamente jurídicas, a declaração apresenta uma visão abrangente e ética sobre IA, posicionando as bibliotecas como espaços de experimentação tecnológica ao serviço do bem comum.

Outros artigos sobre direitos de autor

 

Referências

  1. IFLA. (2025, April 5th). IFLA Statement on Copyright and Artificial Intelligence (AI). https://repository.ifla.org/items/e9f1f982-7876-46ed-91f9-e508a60cda72
  2. IFLA. (2025, 29 April). Realising potential, supporting users: IFLA Statement on Copyright and Artificial Intelligence. https://www.ifla.org/news/realising-potential-supporting-users-ifla-statement-on-copyright-and-artificial-intelligence/

📷 Imagem de Gerd Altmann por Pixabay

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Este trabalho está licenciado sob licença: CC BY-NC-SA 4.0