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Blogue RBE

Qua | 23.02.22

História(s) do Convento em Mafra

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Para José Saramago a História é uma construção do passado numa perspetiva parcial/ ideológica dos homens que tiveram voz/ poder e parcelar/ fragmentada dos grandes acontecimentos e figuras notáveis. 

Questionando estes pontos de vista, nos seus romances Saramago dá visibilidade - e vida - a pessoas anónimas e sem voz/ silenciadas e contextualiza e integra os acontecimentos históricos - “A minha intenção é a procura do que ficou no esquecimento da História” (Aguilera [p. 273]) [1].

Através da imaginação e ficção criadora expande o discurso histórico oficial, apresentando outros pontos de vista/ versões que agregam e suprimem factos, alteram protagonistas, ficcionam o que ficou por contar/ não-dito, expressam o fortuito e mistério.

Esta desconstrução da História convencional é evidenciada no romance Memorial do Convento (1982), cujos protagonistas são Blimunda, mulher que vê o interior das pessoas em jejum e capta as vontades para construir a passarola e Baltazar, soldado que perdeu uma mão na guerra. Vivem uma história de amor abençoada pelo padre Bartolomeu Gusmão, cujo sonho é voar numa passarola. Estas personagens inventadas cruzam-se com o faustoso reinado de D. João V, rei caprichoso que promete erguer um convento em Mafra caso a rainha D. Josefa lhe dê herdeiro para o trono e a gente anónima e oprimida que constrói este convento. 

Ao acrescentar significado ao discurso histórico consolidado, Saramago projeta, para o presente, acontecimentos passados - “Eu entendo a História num sentido sincrónico, onde tudo acontece simultaneamente […]. Para mim, tudo o que ocorreu está a ocorrer. E isto é novo, como afirmava Benedetto Croce ao escrever: ‘Toda a história é história contemporânea’” (Aguilera [pp. 272, 273]).

A literatura pode completar a História, integrando-a no contexto e acrescentando-lhe outros pontos de vista? 

Há acontecimentos históricos – e símbolos - que devem ser revistos/ contextualizados à luz dos valores e visão do mundo da sociedade cosmopolita em que vivemos, para todos reconheçam a História como sua?

História(s) por resgatar e construir [2] é uma atividade proposta pela Rede de Bibliotecas Escolares que desafia crianças e jovens a construírem, através da literatura ou outras disciplinas, uma visão partilhada da História que integre pessoas e culturas que tenham permanecido na sombra do poder/ discurso oficial e que proporcione sentido de pertença e enraizamento. 

Referências

  1. Aguilera, F. (2010, nov.). José Saramago nas suas palavras (2,ª Ed., p. 13). Alfragide: Editorial Caminho.
  2. Rede de Bibliotecas Escolares. (2022). História(s) por resgatar e construir. Lisboa: RBE. https://www.rbe.mec.pt/np4/1980.html
  3. Fonte da imagem: Câmara Municipal de Loures, Câmara Municipal de Lisboa, Lisboa 2020.  (2021). Rota memorial do convento. CML, CML, Lisboa 2020.  https://www.rotamemorialdoconvento.pt/pt/#pll_switcher

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Este trabalho está licenciado sob licença: CC BY-NC-SA 4.0