Fórum RBE 2023: Bibliotecas Escolares - ecos de liberdade e transformação
Na sequência do Fórum RBE 2023: Bibliotecas Escolares - Liberdade e transformação, que teve lugar no dia 24 de outubro, nas instalações da Fundação Calouste Gulbenkian, ocorre refletir um pouco sobre a diversidade e a riqueza de ideias (e ideais) que foram, inevitavelmente, contagiando quem ali se encontrava. Essa riqueza e diversidade (transversalidade), essa liberdade e transformação serão, efetivamente, as pistas certas para o caminho que as bibliotecas escolares devem (continuar a) perseguir nos dias de hoje?
Diremos que sim, sem qualquer hesitação.
Como um ilustre orador confirmou, a biblioteca é (deve ser), o coração da escola. Que responsabilidade esta! É, porém, um coração especial, que pulsa livre, aberto, recetivo, pleno de recursos, ávido de partilha, diálogo e entrega.
Ser criança ou jovem no mundo atual é, à primeira vista, algo fascinante, repleto de maravilhas tecnológicas e barreiras derrubadas, muito para lá do alcance do visível. Mas, como quase sempre acontece, esse fascínio acarreta uma outra face, menos luminosa, na qual, nem tudo o que parece, é…
Como tão bem transmitiram alguns alunos convidados para o painel de partilha de ideias (e ideais), ao serem desafiados a identificar em si mesmos uma qualidade e um defeito, a dualidade dos conceitos e o “verso e o reverso” são uma realidade constante. Duas faces da mesma moeda, dilema, uma questão de perspetiva…
E a leitura, como vai? Como está a nossa relação com a palavra escrita? Sabemos que não é assunto pacífico, nem sequer consensual. Ir ou não ir à biblioteca escolar, eis a questão… O que tem para oferecer? Como são olhados os utilizadores? Que imagem passam para os seus pares? A questão da aceitação tem muito peso no meio juvenil.
O ato da leitura é solitário e o mundo chama-nos lá fora. Recolhimento e ruído não combinam. Em que ficamos? A contemporaneidade contém mais desafios do que podemos humanamente suportar. Como decidir se queremos apenas viver a nossa vida, no prazo que a natureza nos concedeu, ou se estamos tentados a experienciar memória de milhares de anos, desde que há registo gráfico, ou a alargar as nossas vivências através da imaginação dos escritores e dos conhecimentos que nos podem transmitir?
A leitura leva ao pensamento estruturado, estende os horizontes e facilita a competência escrita e a oralidade. Durante toda a nossa vida estas aptidões são essenciais para o exercício da nossa quota de cidadania, de forma independente, distintiva e única, contribuindo para o bem comum, a coesão e o desenvolvimento da sociedade, precisamente o contrário da tendência para a polaridade e o extremismo a que assistimos todos os dias.
Hoje, vendem-se ideias ao desbarato, porque são apenas opiniões pouco ou nada fundadas e fazem-se afirmações como se de verdades se tratasse, a um ritmo alucinante, à beira da náusea. Até para os mais avisados (e aqui a idade não conta) é necessário cautela e uma dose generosa de bom senso. Como fazer a triagem no enredado da teia (web) da sociedade da informação e da comunicação? Como distinguir o trigo do joio?
Cada vez mais, neste campo, a quantidade de conteúdos e a ineficácia da sua regulação, constituem fatores que dificultam exponencialmente a procura da qualidade, do que é fidedigno, correto, verdadeiro.
Os 15 minutos de fama de que falava Warhol, a que todos teríamos direito, um dia, foram completamente ultrapassados, a partir do momento em que todos podemos produzir conteúdos e publicá-los direta e gratuitamente. Uma fama perene, sem prazo, oferecida pela globalização, sem quaisquer custos…, mas os custos existem e são altos.
A pressa e a leveza dos dias que se sucedem tendem a precipitar-nos para atitudes irrefletidas e crédulas, e não combinam com o pensamento crítico e a capacidade analítica que tanta falta nos faz, enquanto sociedade. A Biblioteca Escolar assume uma responsabilidade acrescida, diríamos mesmo, basilar e inclui-se no conjunto de entidades cujos valores de “verdade e confiança”, validado por diversos estudos que colocam as bibliotecas e os museus em patamares iguais). Deste modo, a informação que a biblioteca escolar presta é digna de confiança, por ser credível – objetiva, rigorosa e equilibrada.
Foi tocante, em particular, a criatividade de alguns momentos.
Quem não gosta de uma boa história? E se, para além das palavras que escrevem a história, as personagens ganharem vida e contarem a história, emprestando o seu corpo e a sua voz, movimentando-se e encarnando seres outros, mágicos e enigmáticos, caricatos ou dramáticos, alimentando o nosso imaginário? Os elefantes dão boas histórias… e não se esquecem delas… por terem memória de elefante!
E não é que Arte e Ciência, afinal, andam de mãos dadas, tão próximas como velhas amigas? É algo comum um “artista” ser multifacetado, que a criação não conhece fronteiras. Um pintor que também é escritor… Uma compositora que também é performer… Um bailarino que também é cantor… Uma atriz que também é “graffiter”… Mas um(a) artista cientista ou um(a) cientista artista?!... facto mais raro, capaz de surpreender…
Um orador confirmou-nos que sim, que têm existido pessoas de grande valor que combinam estes saberes. Têm de ser muito curiosas, estas pessoas extraordinárias. Querer saber, investigar, compreender, associar, criar, inventar, elaborar. São pessoas tais, que não esperam receitas, criam-nas, novinhas, sem precisar de instruções. Fogem à regra, pois então! Preferem estar do lado de fora da “caixa” e são maravilhosamente avessos a formatações… Talvez o termo “genial” seja o que melhor as caracteriza.
Estes seres notáveis contribuem para tornar o nosso mundo muito mais interessante, rico e emocionante. Até descobrem padrões ocultos na natureza e desvendam mistérios quiçá insondáveis para a maioria…
São seres livres e transformadores, capazes de nos inspirar.
Com um coração do tamanho do mundo, capaz de acolher todos em igualdade de acesso e oportunidades, queremos e cremos que assim sejam as nossas bibliotecas escolares, também elas capazes de nos inspirar.