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Blogue RBE

Ter | 18.04.23

Educação socioemocional com a biblioteca

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A atual política educativa alicerça-se em pilares que implicam um trabalho cooperativo ao serviço de uma educação e formação de todos os jovens em dimensões que vão muito para lá do mero saber enciclopédico, tal como plasmado no Quadro estratégico 2021-2027[1], que assenta em quatro eixos orientadores - saberes, ligações, sítios e pessoas - e em valores como o bem-estar pessoal e coletivo.

Neste sentido, as bibliotecas escolares devem propor dinâmicas conducentes a “comportamentos e estilos de vida responsáveis, promotores de bem-estar (individual, coletivo, ambiental)” (RBE, 2021, p.47), responsabilidade acrescida pelos recentes resultados do estudo coordenado pela Universidade de Évora, que conclui que um quinto dos estudantes do ensino superior sofre de algum tipo de doença mental, sendo a ansiedade e a depressão as mais mencionadas. Esse estudo revela, ainda,  que “23% dos participantes toma medicação para a ansiedade, depressão, insónias ou outro problema psíquico,  e que, destes, quase metade foram diagnosticados após o início da pandemia de Covid-19.” [2].

Neste contexto, cabe aos educadores e às várias estruturas da comunidade educativa implementar programas ou ações de aprendizagem socioemocional para fomentar a saúde mental, afigurando-se a biblioteca escolar como uma estrutura e um espaço privilegiado para a sua implementação.

Jessica Fitzpatrick é professora bibliotecária numa escola em Houston, EUA, e advoga [3] a necessidade de as bibliotecas escolares criarem uma cultura que aposte no desenvolvimento de diversas atividades SEL (Social Emotional Learning), para promover a saúde mental, fundamental para o sucesso dos alunos e para o seu desenvolvimento integral.

Partindo da sua experiência de bibliotecária, sabe que as bibliotecas acolhem, sendo muitas vezes um refúgio para os alunos quando se sentem sobrecarregados, ansiosos, stressados… e necessitam de um espaço seguro ou somente de um espaço onde possam permanecer livremente. Por isso, esta bibliotecária tem apostado em disponibilizar atividades SEL, umas mais simples e mais pontuais do que outras, que podem requerer a colaboração de terceiros (psicólogos, professores, mentores…), destinadas a alunos, ao pessoal docente e não docente da comunidade educativa.  A colaboração de terceiros traz ganhos muito significativos, em termos de recursos humanos e técnicos, criando uma cultura de promoção de competências SEL, com e a partir da biblioteca, fundamental para uma comunidade educativa coesa.

A construção de uma cultura que cuida do outro, que promove SEL, começa com pequenos gestos de acolhimento e com propostas de atividades promotoras de bem-estar. A bibliotecária referida partilha um conjunto de atividades que não implicam grandes custos e que podem ser facilmente postas em prática em qualquer biblioteca escolar:

- Bullet Journal (“diário de balas”) - Uma técnica criada por Ryder Carroll, que se tem revelado bastante eficaz no tratamento da depressão, ansiedade e stress, pois possibilita um grau de consciencialização conducente à superação de obstáculos, de problemas e de sentimentos negativos causadores de mal-estar. Consiste no registo escrito e/ou gráfico, regular e de forma totalmente livre, dos pensamentos, das ideias, dos desafios, o que contribui para reduzir o stress e manter o foco, priorizando  o que é realmente importante.

-Aguarela – O uso da técnica da aguarela é uma ótima ferramenta para permitir que os alunos sejam o mais livremente criativos e libertem a sua ansiedade, pois dispõem de total liberdade na seleção do tipo e tamanho de papel, das cores a utilizar e dos temas/assuntos.  Esta estratégia é particularmente cara para Jessica, porque, no seu entender, cria-se arte comunitária que pode, depois, ser exposta.

-Speed Friending (“Amizade rápida”) – Uma técnica que consiste numa variante do “Speed Dating”, destinada a criar laços/amigos. Cada aluno recebe um número e um conjunto de perguntas e a ideia é que interajam com outros colegas (as perguntas apenas orientam a conversa, salvaguardando situações de maior inibição). Esta técnica permite que conheçam outros colegas que, de outro modo, não iriam conhecer nunca.

- Origami Worry Boxes (“As Caixas de preocupações de Origami”) - Uma atividade a que a bibliotecária dá início  no Dia Nacional do Origami, a 11 de novembro. Depois de  ensinar os alunos a fazer uma caixa com recurso à técnica  origami,  estes são incentivados a registar por escrito as suas preocupações, como forma de catarse,  depositando-as, posteriormente, nas caixas para serem esquecidas.

- Coloring Pages (“Páginas para colorir”) – As páginas para colorir, com desenhos mais ou menos sofisticados e respondendo a temáticas diversas, são uma ótima forma de os alunos se libertarem das suas preocupações  e pressões, mudando o foco da sua atenção.

- Write down, ripe up, and throw away (“Escrever, amarrotar e deitar fora [o papel]”) - Esta atividade SEL é uma maneira divertida de levar os alunos a exteriorizarem e libertarem-se do que os preocupa, da ansiedade ou do stress que os domina. Consiste em pôr os alunos a escreverem, numa folha, o que os perturba, amarrotando-a e deitando-a fora, como forma de alívio/expiação.

São somente alguns exemplos aduzidos pela bibliotecária americana para salientar a necessidade de as bibliotecas escolares se assumirem como ambientes acolhedores e seguros, propondo atividades que contribuam para a criação de uma cultura promotora de bem-estar, equilíbrio emocional e saúde mental, condições essenciais para o sucesso do ensino-aprendizagem e para a realização de todos os elementos da comunidade educativa e… da sociedade em geral.

 

Referências

[1] RBE (2021). Bibliotecas Escolares: presentes para o futuro. Programa Rede de Bibliotecas Escolares:  Quadro estratégico: 2021-2027. RBE- Ministério da Educação. https://rbe.mec.pt/np4/?newsId=890&fileName=qe__21.27.pdf

[2] Agência Lusa (2023, 6 de março). Um quinto dos estudantes do ensino superior possui algum tipo de doença mental. Observador. https://observador.pt/2023/03/06/um-quinto-dos-estudantes-do-ensino-superior-possui-algum-tipo-de-doenca-mental-diz-estudo/

[3] Fitzpatrick , J. (2022, 31 August).Different types of SEL Activities to Build School Library Culture. Knowledge Quest. American Association of School Librarians. https://knowledgequest.aasl.org/different-types-of-sel-activities-to-build-school-library-culture/

[4] Imagem de Gerd Altmann por Pixabay 

 

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Este trabalho está licenciado sob licença: CC BY-NC-SA 4.0