Como reconhecer conteúdos criados por inteligência artificial?
Vivemos num tempo em que a inteligência artificial (IA) permite criar conteúdos altamente realistas — imagens, vídeos, textos e até vozes — capazes de enganar até os olhos e ouvidos mais atentos. Estes conteúdos, também designados por "sintéticos", são criados artificialmente por sistemas de IA e distinguem-se por não resultarem de captação direta da realidade. Entre estes, destacam-se os chamados deepfakes, vídeos manipulados digitalmente para alterar rostos, vozes ou contextos, muitas vezes com o intuito de enganar ou manipular a perceção pública. Esta capacidade tecnológica coloca desafios significativos à literacia mediática e à educação para a cidadania digital.
Este artigo surge no âmbito da operação 7 Dias com os Media e pretende contribuir para a reflexão sobre os desafios atuais, com especial enfoque na inteligência artificial e nos conteúdos sintéticos que esta tecnologia permite gerar.
Assim, propomos algumas estratégias práticas para ajudar alunos, professores e a comunidade educativa a reconhecerem conteúdos artificiais e a desenvolverem um olhar crítico.
1. Como identificar imagens geradas por inteligência artificial?
A identificação de imagens geradas por inteligência artificial exige um olhar atento aos detalhes. Elementos como mãos com dedos a mais ou deformados, fundos desfocados ou incoerentes, sombras e reflexos mal posicionados podem ser indícios de que se trata de uma imagem sintética.
Para além da observação visual, é útil recorrer a ferramentas de verificação, como motores de pesquisa por imagem (por exemplo, Google Lens ou TinEye), que permitem rastrear a origem da imagem e verificar se já foi publicada anteriormente.
Quando disponível, a análise dos metadados do ficheiro pode também fornecer pistas relevantes sobre a sua criação.
Adicionalmente, existem plataformas específicas de deteção de conteúdos gerados por IA, como Hive, Illuminarty ou AI or Not, que analisam as características da imagem e indicam a probabilidade de esta ser artificial.
2. Como identificar vídeos gerados ou manipulados por IA?
A deteção de vídeos gerados ou manipulados por inteligência artificial implica uma análise atenta de diversos elementos.
As incongruências visuais são um dos primeiros sinais a observar: movimentos labiais que não coincidem com o áudio, expressões faciais estranhas ou repetitivas, e movimentos corporais pouco naturais podem indiciar manipulação digital.
No som, as vozes sintéticas distinguem-se frequentemente por uma entoação pouco expressiva ou por pausas e ritmos artificiais.
Para além da análise do conteúdo em si, é fundamental contextualizar a fonte do vídeo: verificar o canal onde foi publicado, a data de publicação e cruzar essa informação com fontes fidedignas.
Atualmente, existem também ferramentas especializadas na deteção de vídeos manipulados por IA, como o Deepware Scanner ou o InVID, que ajudam a identificar deepfakes e outras formas de manipulação audiovisual.
3. Como identificar textos e narrativas falsas?
Para identificar textos e narrativas falsas, é essencial adotar uma postura crítica e informada.
Um primeiro passo consiste na verificação de factos, através de plataformas especializadas como o Polígrafo, o Observador Fact Check ou fontes internacionais como o Snopes, que analisam a veracidade das informações difundidas.
Os textos gerados por IA tendem a apresentar certos padrões, como frases genéricas, repetições e incoerências internas.
Outro sinal de alerta é a ausência de fontes credíveis ou a presença de testemunhos vagos, frequentemente atribuídos a figuras não identificadas, como "um especialista".
Para complementar a análise, podem ser utilizadas ferramentas de deteção de texto artificial, como o GPTZero ou o AI Text Classifier da OpenAI, que ajudam a avaliar a probabilidade de um texto ter sido escrito por um sistema de IA.
4. O papel da biblioteca escolar
Neste contexto, em que conteúdos sintéticos se confundem facilmente com conteúdos reais, a capacidade de os identificar torna-se crucial para o exercício de uma cidadania consciente e informada. Saber distinguir o verdadeiro do falso, o natural do artificial, é hoje uma competência essencial para todos os que navegam no mundo digital, em particular os mais jovens.
Capacitar os alunos para essa distinção implica proporcionar-lhes oportunidades de aprendizagem em que possam explorar, testar e aplicar ferramentas e estratégias de verificação. Projetos, oficinas e atividades práticas podem e devem ser integrados nos planos de atividades das bibliotecas escolares, promovendo o pensamento crítico e a cidadania informada.
Deste modo, tornamo-nos parceiros incontornáveis, num trabalho articulado com as diferentes áreas curriculares, de forma sistemática, coerente e com um propósito claramente definido.
Num mundo onde a IA pode criar o que nunca aconteceu, saber interpretar, questionar e investigar é mais importante do que nunca. A educação para os media, o cruzamento de fontes e o pensamento crítico são os melhores aliados contra a desinformação.
E todos somos poucos face à complexidade atual!
Referências
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- HostGator. (s.d.). 8 ferramentas para identificar conteúdos gerados por IA. https://www.hostgator.com.br/blog/ferramentas-identificar-conteudos-gerado-ia/
- Pinto, F. (2025, 3 de maio). Donald Trump publica imagem IA vestido de Papa nas redes sociais e causa polémica. Euronews. https://pt.euronews.com/2025/05/03/donald-trump-publica-imagem-ia-vestido-de-papa-nas-redes-sociais-e-causa-polemica
- Rock Content. (s.d.). Como identificar conteúdo criado por inteligência artificial?. https://rockcontent.com/br/blog/como-identificar-conteudo-criado-por-inteligencia-artificial/
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- Wong, V. (2024, 30 de maio). 8 imagens virais criadas por IA. Piktochart. https://piktochart.com/pt-br/blog/imagens-virais-ia/
- Wu, R. (2024, 9 de fevereiro). O que imagens falsas de Taylor Swift indicam para o debate sobre uso de IA. CNN Brasil. https://www.cnnbrasil.com.br/blogs/rita-wu/tecnologia/o-que-imagens-falsas-de-taylor-swift-indicam-para-o-debate-sobre-uso-de-ia/
- 📷 Imagens de conteúdo artificial retiradas dos artigos em referências