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“Livros, procuravam livros.
Era o segredo mais bem guardado da corte egípcia. O Senhor das Duas Terras, um dos homens mais poderosos do momento, daria a vida (a dos outros, claro; é sempre assim com os reis) para conseguir todos os do mundo para a sua Grande Biblioteca de Alexandria. Perseguia o sonho de uma biblioteca absoluta e perfeita, a coleção onde reuniria todas as obras de todos os autores desde o início dos tempos.”
Irene Vallejo. In O Infinito num Junco. 2021. Lisboa: Bertrand Editora.
Vivemos, hoje, uma época de grandes desafios em que coexistem de forma contrastante perigos e oportunidades.
A Escola do século XXI tem de conseguir responder a estes desafios, perspetivando o futuro promissor marcado pelo digital (mesmo sabendo que as debilidades são ainda muitas) sem, contudo, esquecer que a Escola não se faz sem as relações humanas e as suas emoções, sem práticas colaborativas e comunitárias. A Escola do século XXI tem, pois, de se afirmar, promovendo aprendizagens no âmbito da tomada de decisões sustentadas, preparando os alunos para o incerto e desafiante mercado de trabalho e para uma intervenção ativa e construtiva na sociedade. Não sendo um papel novo para a Escola, este é, contudo, um desafio que assume novos contornos, pelo ritmo a que a realidade muda, pela imprevisibilidade de muitas das mudanças, pela imensidade de informação a que temos acesso, entre outras.
Essa afirmação passa por mudanças de organização, de metodologias, e sobretudo de mentalidades, sempre tão difíceis de implementar. E as Bibliotecas, nomeadamente as Bibliotecas Escolares, pelos recursos que disponibilizam, pela formação dos professores que as dirigem e pelas diretrizes do(s) organismo(s) que as coordena(m), podem e devem constituir um polo dinamizador de transformações, desafio que exige respostas consistentes e informadas.
Sem ficarmos ancorados em práticas do passado, e mesmo do presente, não devemos temer, então, enfrentar os inevitáveis desafios que a imprevisibilidade tão característica do mundo atual nos lança. Conseguir gerir o conhecimento científico e tecnológico que se desenvolve a um ritmo, por vezes, assustador e a informação que, diariamente, se cria à escala global e nos confronta é já, e continuará a sê-lo, a grande preocupação dos professores bibliotecários.
É, pois, bem consciente da importância do trabalho colaborativo e cooperativo entre pares e de que as práticas pedagógicas entre comunidades educativas são sempre promotoras de crescimento profissional que, enquanto professora bibliotecária da Escola Secundária da Boa Nova – Leça da Palmeira, procuro desenvolver ações enriquecedoras para a vida dos nossos jovens alunos, tentando muni-los de ferramentas que lhes desenvolvam a capacidade crítica e interventiva, permitindo-lhes enfrentar a sociedade de hoje sempre em mudança. E porque acredito que juntos somos sempre mais fortes, considero que, hoje, as escolas em rede (concelhia, nacional e, porque não internacional), sem nunca esquecerem a importância da humanização, podem ser uma mais-valia para responder melhor a este futuro que nos chega de rompante.
Confiando no trabalho em equipa, com o fito de promover a construção integrada dos saberes (com recurso a aprendizagens ativas numa perspetiva transdisciplinar), e rentabilizando recursos, podemos reforçar parcerias internas e externas, apresentando propostas dinâmicas de ações sobre temas da atualidade (formato palestras/comunidades de leitores/planos de ação - atividades práticas no domínio da educação para a cidadania) que, na rota de um futuro mais auspicioso para toda a Humanidade, procurem encontrar soluções para a criação de um mundo melhor, ações que ajudem os nossos alunos a serem agentes mais criativos e dotados de mais humanidade.
Sendo uma prática já por mim experimentada, posso assegurar que, tratando-se de um trabalho de partilha, este nos obriga a conversar, a refletir, a “vermo-nos ao espelho” e a querer sempre melhorar. Saímos da nossa zona de conforto, criamos novos olhares, edificamos pontes, construímos uma nova forma de ensinar, uma nova forma de fazer a escola, uma escola com mais educação, com mais futuro e que procura, todos os dias, despertar os nossos jovens alunos para os imensos e complexos problemas que invadem o nosso planeta, levando-os a agir.
É fácil? Nem sempre! Mas compensa. E se “Em Alexandria, a fome de livros desenfreada começava a converter-se num surto de loucura apaixonada.” (in op. cit, p. 17), estas práticas podem tornar-se, também elas, numa paixão que em nada aniquila a paixão pelos livros que, julgo, caracterizam todos os professores bibliotecários.
Isabel Gomes Ferreira
Professora bibliotecária – Biblioteca António Nobre, Escola Secundária da Boa Nova – Leça da Palmeira