Relatório de tendências da IFLA 2023
O que é?
O Relatório de Tendências da IFLA (International Federation of Library Associations and Institutions – associação de que a RBE é membro desde 2022), publicado pela primeira vez em 2013 e atualizado anualmente, identifica cinco tendências de alto nível que moldam a sociedade da informação, abrangendo o acesso à educação, privacidade, envolvimento cívico e transformação.
Como iremos aceder, utilizar e beneficiar da informação num mundo cada vez mais hiperconectado?
É esta a pergunta de partida e pretende-se que este Relatório seja um ponto de partida - um catalisador - para a discussão, tanto no campo das bibliotecas, como quando se fala com parceiros externos. É um apoio para ajudar a pensar o que é necessário fazer para estarmos preparados para o que está para vir, de modo a que as bibliotecas possam não apenas sobreviver, mas prosperar.
As suas conclusões refletem uma consulta anual a uma série de especialistas e partes interessadas de diferentes disciplinas para mapear as mudanças sociais mais amplas que ocorrem ou que provavelmente ocorrerão no ambiente da informação.
Mais do que um único documento, o Relatório de Tendências da IFLA é uma seleção de recursos para ajudar a compreender onde as bibliotecas se enquadram numa sociedade em mudança que estão disponíveis num sítio Web especificamente dedicado: https://trends.ifla.org./
O Relatório de tendências da IFLA 2023 [1] é o último da atual série de "pequenas" atualizações do Relatório de Tendências. Em 2024, a IFLA espera lançar uma nova "grande" atualização, que seguirá os passos do original de 2013.
Tendências de alto nível
O Relatório identifica cinco tendências de alto nível que desempenharão um papel fundamental na formação do nosso futuro ecossistema de informação:
TENDÊNCIA 1 As novas tecnologias irão expandir e limitar quem tem acesso à informação.
TENDÊNCIA 2 A educação online irá democratizar e perturbar a aprendizagem global.
TENDÊNCIA 3 Os limites da privacidade e da proteção de dados serão redefinidos.
TENDÊNCIA 4 As sociedades hiperconectadas ouvirão e capacitarão novas vozes e grupos.
TENDÊNCIA 5 O ambiente global da informação será transformado pelas novas tecnologias.
Tendências 2023 e respostas necessárias
O Relatório 2023 identifica 12 tendências e apresenta várias respostas importantes que podem ajudar a pensar todos os que se ocupam de bibliotecas desde o nível macro (como a Rede de Bibliotecas Escolares) como a nível micro (cada uma das bibliotecas escolares).
Neste artigo apresentamos uma súmula das questões que nos pareceram mais significativas par ao mundo das bibliotecas escolares, no entanto aconselhamos vivamente a leitura integral do documento.
1. As bibliotecas são cada vez mais vistas como irrelevantes num mundo em mudança
Temos de encarar a advocacia como uma parte essencial da concretização dos nossos objetivos.
Devem ser envidados esforços para garantir que os decisores políticos e as partes interessadas reconheçam o potencial transformador das bibliotecas modernas e as integrem efetivamente nas estratégias de desenvolvimento.
Temos de ser capazes de mostrar como também conseguimos reavaliar as nossas estratégias, serviços, políticas e programas para permanecermos relevantes na era digital.
Temos de tomar medidas proactivas para sublinhar o nosso papel indispensável, não só perante as entidades governamentais e as partes interessadas, mas também perante o público em geral.
Temos de nos ver - e ser vistos - como participantes ativos com uma voz legítima e contributos valiosos para oferecer.
2. O mundo está a enveredar por um caminho que desconsidera o valor das infraestruturas comunitárias e da informação para o desenvolvimento.
Precisamos de garantir que estamos a concretizar plenamente o potencial do nosso papel nas comunidades como espaços de acesso e criação de conhecimento e, por conseguinte, de capacitação.
Temos de ajudar as comunidades a tomar consciência do valor do que têm, e a prepararem-se para o defender. Através do apoio à participação cívica, ajudamos a dar a mais pessoas a confiança e as competências para advogar e defender a importância de instituições como as nossas.
Temos de unir esforços para defendermos um ambiente de informação saudável na política e na legislação. Esta não pode ser apenas uma questão de regulamentar os excessos de algumas grandes plataformas da Internet, mas sim explorar a forma como nós - em parceria com outros - podemos construir, de forma positiva, uma agenda global para a integridade da informação.
Precisamos de encontrar formas de ajudar as pessoas a desenvolverem a curiosidade e aprenderem a ser críticas e confiantes quando lidam com a incerteza, em vez de chegarem a conclusões fáceis.
3. Em muitos países, a despesa pública - e, por conseguinte, a margem de investimento - está a diminuir
Temos de ser mais claros e mais eficazes na defesa dos nossos interesses. Trata-se, em parte, de garantir que podemos honestamente dizer aos financiadores que estamos a utilizar da forma mais eficaz os recursos que recebemos, mas também sermos claros na nossa defesa de que gastar em bibliotecas é um investimento e não um custo.
Temos de falar em termos que os decisores compreendam e respondam.
4. Sociedades mais diversas tornam mais complexa a prestação de serviços universais e a consecução da equidade
É necessário pensar em novas formas de prestação de serviços que os tornem disponíveis e acolhedores para todos, independentemente da situação de cada um, e avaliar o que o que fazemos na perspetiva de todas as medidas comunitárias.
Temos de trabalhar ativamente para colmatar as lacunas e fazer das bibliotecas um local onde todos se sintam valorizados, empoderados e capazes de tirar pleno partido das oportunidades que elas oferecem.
Precisamos de nos certificar que temos, dentro da nossa própria força de trabalho, a maior diversidade possível. É necessário atrair e reter talentos diversificados para a nossa profissão de modo a garantir que refletimos as comunidades que servimos.
5. A regulamentação dos espaços digitais está a acelerar, mas sem considerar os impactos no modo como as bibliotecas apoiam desenvolvimento
Devemos ver-nos - e ser vistos - como partes interessadas nos debates sobre a governação da Internet, e até explorar a forma como podemos ajudar as nossas as comunidades a empenharem-se mais nesta matéria, pois, em última análise, são elas que suportarão as consequências da redução do acesso à informação e à expressão.
É necessário sublinhar o valor da liberdade intelectual e do conhecimento profissional, bem como do acesso à cultura, à investigação e à educação.
Temos de pensar o modo como podemos garantir que cada indivíduo tem acesso à informação e às competências de que necessita para prosperar. Devemos também promover iniciativas de literacia digital que possam capacitar os utilizadores para navegarem on-line de forma responsável e defender políticas que promovam um acesso equitativo à informação para todos.
É urgente tornar claro que as bibliotecas devem ser isentas das regras destinadas a plataformas multimilionárias.
6. Um mundo cada vez mais incerto intensifica os desafios e dificulta a prestação de serviços
É necessário assegurar a integração significativa das bibliotecas e das suas coleções no planeamento da gestão do risco de catástrofes: preservação dos edifícios, das coleções e dos técnicos.
Temos de tirar partido da nossa experiência e recursos para capacitar as comunidades para navegarem na incerteza e para promoverem mudanças positivas, assegurando que as bibliotecas continuam a ser pilares de apoio, indispensáveis num mundo cada vez mais incerto.
7. Existem obstáculos persistentes e crescentes à criação de parcerias para o desenvolvimento
É essencial que as bibliotecas cultivem confiança e disponibilidade para estabelecer parcerias com diversas partes interessadas, compreendendo os seus contributos únicos e o seu potencial impacto.
Devemos estar preparados para chamar a atenção para os obstáculos administrativos e jurídicos ou outros que dificultam o trabalho com os outros.
8. As desigualdades geográficas persistentes são reforçadas por um investimento desigual nos serviços públicos
Devemos melhorar a coordenação e a criação de redes dentro dos países para facilitar a colaboração entre serviços bibliotecários.
É fundamental tirar partido da tecnologia, da acessibilidade linguística e automatização do sistema para simplificar esforços e permitir uma comunicação eficiente e a partilha de recursos entre bibliotecas de diferentes tamanhos e localizações.
É imprescindível aproveitar o potencial da Internet para alargar o acesso a uma infinidade de serviços.
Temos de promover o desenvolvimento de serviços centrais (digitais) que possam facilitar o trabalho de profissionais em zonas mais desfavorecidas.
É necessário estabelecer parcerias com governos locais, programas de divulgação e outros potenciais parceiros para criar programas inovadores que minimizem os impactos das desigualdades regionais.
Precisamos de nos empenharmos na cooperação internacional e interajudarmo-nos.
9. Os trabalhadores das bibliotecas e da informação são vistos como auxiliares e não como atores do desenvolvimento por direito próprio
É preciso garantir que os bibliotecários sejam proativos e expliquem de forma clara, convincente e persistentemente porque é que são importantes.
Temos de sublinhar a importância da aprendizagem contínua e do desenvolvimento profissional e assegurarmo-nos de que permanecemos na vanguarda da inovação, dominando as competências necessárias para fazer face à evolução e aos desafios e servir eficazmente as nossas comunidades.
É necessário criar um consenso alargado em torno da necessidade de defender a biblioteconomia profissional e elevar o estatuto dos trabalhadores das bibliotecas e da informação, através de uma ação coletiva em defesa desta causa.
É importante resistir a esforços para eliminar a obrigação de contratar bibliotecários para funções de bibliotecário, mas também oferecer possibilidades para os não bibliotecários desenvolverem competências.
10. A globalização continua a abrir novas expectativas para o acesso à informação
Deve haver uma agenda positiva a nível nacional e internacional para garantir que as bibliotecas tenham direitos e confiança para agirem internacionalmente, disponibilizando as coleções tanto quanto possível, bem como ajudando as suas comunidades a aceder e a utilizar a informação de que necessitam, onde quer que ela se encontre.
11. Mesmo com a melhoria da conetividade, o fosso digital persiste e está a agravar-se
É preciso reconhecer o lugar das bibliotecas como atores multifuncionais nas estratégias de inclusão digital.
Precisamos de uma abordagem construtiva, embora crítica, da Internet, e um maior sentido de agência e mesmo de responsabilidade em ajudar os utilizadores a tirar o máximo partido dela e a dar o salto para uma utilização segura, ética e confiante.
12. Estamos demasiado ocupados a lidar com crises para pensar estrategicamente
É necessário promover iniciativas de aprendizagem ao longo da vida e alargar as ofertas educativas para além dos contextos formais (tanto para nós próprios como para as nossas comunidades) para aumentar a resiliência e a capacidade de reação. Os esforços coletivos podem cultivar uma cultura de pensamento estratégico.
Temos de investir em estratégias de desenvolvimento de talentos concebidas para cultivar futuros líderes e dar-lhes a oportunidade de desenvolverem competências que complementem as adquiridas no ensino formal.
É necessário desenvolver ferramentas que ajudem os bibliotecários a estruturarem o seu pensamento, e sentirem-se mais capacitados e confiantes para responder à mudança.
Referência
[1] IFLA (2024). IFLA Trend Report Update 2023. https://trends.ifla.org./update-2023
📷 Fonte das imagens: https://trends.ifla.org./
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