A Escola Básica Frei Manuel Cardoso, do Agrupamento de Escolas de Fronteira esteve em festa na tarde do dia 26 de outubro: após um processo de requalificação do espaço, o qual contou com o apoio da RBE e investimento do Agrupamento, o espaço foi apresentado à comunidade educativa.
A biblioteca escolar passou a disponibilizar um espaço flexível, moderno e adaptado às necessidades atuais dos alunos. Para isso, foi adquirido mobiliário novo, funcional, permitindo uma utilização e transformação constante do espaço. Uma biblioteca moderna, com um fundo documental atualizado e equipamento atual e atrativo, para toda a comunidade.
A iniciativa contou com a presença da Dra. Fátima Bonzinho, em representação da RBE, Dra. Maria Mário Murteira e Dra. Ana Martins em representação da DGEstE; o Diretor do Agrupamento, Dr. João Pedro Polido; Sub- Diretora do Agrupamento, Dra. Maria do Céu Peças; Vereadora da Educação Dra. Rita Teixeira Rodrigues; Presidente da Freguesia de Fronteira, Sr. António Luís Palrão; para além de outros convidados, Técnica Superior da Biblioteca Municipal; Professores; Alunos; Assistentes Técnicos e Operacionais.
O evento (Re) Criar a Biblioteca foi integrado nas comemorações do Mês Internacional das Bibliotecas Escolares (MIBE) e contou com uma animação, dinamizada pelo S’Em Fronteiras, Grupo de Teatro Escolar do Agrupamento, sob a encenação de Maria de Campos, baseada nas seguintes obras:
Todos os escritores do mundo têm a cabeça cheia de piolhos de José Luís Peixoto
A fada Palavrinha e o Gigante das Bibliotecas, de Luísa Ducla Soares
O morcego bibliotecário, de Cármen Zita Ferreira
A Biblioteca é uma casa onde cabe toda a gente, de Mafalda Milhões.
A Professora Bibliotecária, Ana Maria Taveira apresentou o projeto @treve-te +, que o Agrupamento de Escolas de Fronteira e a Biblioteca Escolar viram aprovado e financiado pela Rede de Bibliotecas Escolares (RBE) e que permitiu a requalificação do espaço. Este projeto permitiu a criação de um canal digital, onde são disponibilizadas videoaulas de apoio ao desenvolvimento curricular, uma mais-valia para toda a comunidade escolar.
A cerimónia culminou com o descerramento de uma placa onde ficou registado o reconhecimento pelo apoio do Diretor do Agrupamento, Dr. João Pedro Polido.
Neste ano de 2023, comemora-se o centenário de nascimento de Italo Calvino (1923-1985), um dos mais amados e apreciados escritores italianos do século XX, a sua obra é conhecida no mundo inteiro.
A sua obra é extensa, a sua escrita fantástica, interventiva, caleidoscópica e considerada, por muitos, experimental e inovadora. Selecionar um livro para partilhar é tarefa difícil e redutora, mas arriscamos eleger Se numa Noite de Inverno um Viajante para partilhar na rubrica Tempo para Ler.
Em 1979, Italo Calvino escreve Se numa Noite de Inverno um Viajante, um romance com uma arquitetura original: narrativas interligadas, ao longo de doze capítulos, numa estrutura não linear e numa cartografia de cruzamentos e desencontros, de histórias dentro de histórias, de surpresas deliciosas e desprezíveis, temos o prazer de conhecer os protagonistas, o leitor e a leitora, que pretendem desvendar o enigma dos romances inacabados e dos manuscritos roubados e falsificados.
“Estás a começar a ler o novo romance Se numa noite de Inverno um viajante de Italo Calvino. Descontrai-te. Recolhe-te. Afasta de ti todos os outros pensamentos. Deixa esfumar-se no indistinto o mundo que te rodeia. A porta é melhor fechá-la; lá dentro a televisão está sempre acesa. Diz aos outros: “Estou a ler! Não quero que me incomodem! (…) Arranja a posição mais cómoda: sentado, estendido, enroscado, deitado. Deitado de costas, de lado, de barriga. Na poltrona, no sofá, na cadeira, de baloiço, na cadeira de praia, no pufe. Numa cama de rede, ser tiveres alguma cama de rede, Em cima da cama, naturalmente, ou dentro da cama. Até podes pôr-te de cabeça para baixo, em posição de ioga. Com o livro virado ao contrário, bem entendido. (…) Bem, afinal, o que estás à espera?”
No cerne da trama encontra-se o personagem tradutor Hermes Marana, o qual serve não só como recurso narrativo para aumentar o grau de desconfiança do leitor e da leitora como também para questionar o papel do autor e do tradutor dentro do universo literário. Italo Calvino, por meio do personagem tradutor, ironiza a idealização do autor como criador absoluto do texto literário. Num permanente jogo entre o “leitor”, a “leitora” personagens que estão no centro da narrativa e o leitor e leitora comuns, quer dizer nós, há um envolvimento cúmplice que permanece ao longo da deslumbrante leitura desta obra-prima pós-modernista.
“Apareceste pela primeira vez ao Leitor numa livraria, ganhaste forma destacando-te de uma parede de estantes, como se a quantidade dos livros tornasse necessária a presença de uma Leitora”.
O leitor e a leitora têm como missão ler romances, embora tenham consciência de que “há livros com que simpatizo, e livros que não consigo suportar e que me vêm para sempre às mãos” e é neste encontro e desencontro de hectares e hectares de livros “que Podes Passar Sem Ler, os Livros Feitos Para Outros Usos Além Da Leitura, os Livros Já Lidos Sem Ser Preciso Sequer Abri-los Por Pertencerem À Categoria Do Já Lido Antes De Ser Escrito (…) Livros Que Se Tivesses Mais Vidas Para Viver Certamente Lerias Também De Bom Grado Mas Infelizmente Os Dias Que Tens Para Viver São Os Que Tens Contados ” , de géneros literários, preferências que oscilam entre o mistério, a angústia, a literatura erótica ou a de viagens, entre outras, que se constroem mapas literários inimagináveis.
“Na leitura dá-se qualquer coisa sobre a qual não tenho poder”, o verdadeiro leitor apenas tem a certeza de que a leitura provoca inquietação e infinitas possibilidades para que se (re)comece um processo sempre inacabado de novos eus, vivências e novas geografias.
Ler Se numa Noite de Invernoum Viajante é um verdadeiro desafio para nós, leitores reais, incitados a (re)pensar a literatura com a própria literatura, bem como a envolver-nos com outros personagens que fazem parte do universo literário, tais como o tradutor, o agente literário, o editor, o crítico literário ou o próprio autor. Ao longo da leitura, compreende-se os desassossegos de Calvino, muito vanguardistas para a época, entrelaçando a metalinguagem com uma narrativa de amor, suspense, erotismo e paixão. Afinal, o que faz de um romance um bom romance?
Por Cristina Rocha, professora bibliotecária do AE da Boa Água, Sesimbra
Viajar pelo paralelo e conseguir estar em dois lugares ao mesmo tempo é coisa que só um professor bibliotecário consegue. Dias vêm e vão em que colegas se cruzam com a frasezinha engraçada do “ Já não te via há uns dias” e a resposta salta sem travão “Tenho estado sempre na… loja”.
Ser professor bibliotecário é chegar mais cedo, criar coisas malucas como as sessões de “Leitura Criminal a que chamamos “Criminal Me”, é estar ao segundo em prontidão como os bombeiros. Mas, acima de tudo, é poder contactar com jovens de diferentes idades, que de uma forma geral querem bem à biblioteca e estão curiosos. Ensinam muito também.
O mago professor bibliotecário explora essa curiosidade, espalhando pó de estrela em forma de títulos de livros, ideias para projetos, momentos de risota e de leitura de jogo e até de crochet e de tricot. Porque a biblioteca é o espaço para tudo. Até para descansar. Por vezes, basta sentar em frente ao aquário e relaxar. Reequilibrar energias.
São muitas as vezes, porém, em que a sensação de que se faz pouco vem, por sermos muito críticos de nós mesmos e, ao mesmo tempo, egoicos ao ponto de pensar que podemos mudar o mundo se multiplicarmos eventos. Precisava de me clonar. É essa a sensação. Para poder assegurar as oito horitas de sono, algumas para comer e outras para me divertir. A biblioteca é uma nave gigante que poucos veem. Leva tudo a todo o lado, assim o queiram.
O melhor que levamos são mesmo os momentos com os alunos e colegas que, ávidos de ver, de ler, de escrever, de apresentar em voz alta, de jogar xadrez, damas, party and company, mikado, superT ou UNO e muito, muito mais.
Este ano, a escola começou tão bem… recebemos 1400 pimpolhos, à vez, no mês de outubro todinho, como nos anos anteriores, de resto. Mas a energia que havia no ar era mais leve. Misturámos horas de conto fantásticas, e houve até quem viesse com os olhitos brilhantes e um sorriso doce dizer, “E quando aprendemos francês?”. Tinha esquecido que, no final do ano letivo passado, em junho, quando todos partem, ficam eles, os do 1º ciclo. Num tempo quente que convida a praia… e foi então que a BE virou palco de músicas e comptines em francês para os do 2ºH. E como eles aprendiam bem… cantando e dançando.
Tenho mesmo que ir para o paralelo e cocriar o meu clone… muitos clones de muitos de nós. Não por ego, mas para chegarmos a todos os jovens e crianças do país.
A biblioteca é o colo da escola onde os abraços se dão, os sorrisos se espalham.
Cristina Rocha, professora bibliotecária do AE da Boa Água, Sesimbra Novembro 2023
*Qualquer semelhança entre o título desta rubrica e a obra Retalhos da vida de um médico, não é pura coincidência; é uma vénia a Fernando Namora.
Esta rubrica visa apresentar apontamentos breves do quotidiano dos professores bibliotecários, sem qualquer preocupação cronológica, científica ou outra. Trata-se simplesmente da partilha informal de vivências.
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