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Blogue RBE

Ter | 07.02.23

Metaverso & Educação: uma aliança com futuro?

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Dando continuidade à preparação do Dia da Internet Mais Segura, prosseguimos com a publicação de artigos subordinados ao tema deste ano: Metaverso vs Realidade.

Depois de clarificar a origem e alguns conceitos associados ao metaverso (Metaverso... uma tecnologia que veio para ficar, Metaverso vs Realidade, ABC do Metaverso), bem como algumas das potencialidades e riscos desta tecnologia em várias áreas profissionais e de lazer (Metaverso: o melhor de vários mundos?, Metaverso: cautelas e caldos de galinha…), impõe-se, agora, uma breve reflexão em torno das potencialidades que oferece aos educadores e aprendentes do século XXI.

Os anos da pandemia aceleraram a necessidade de uma revolução nas escolas, ao nível da formação de professores e de práticas, de equipamentos e plataformas, ao ponto de alguns estudiosos distinguirem um modelo educacional pré e pós-pandemia. Assim, no período pós-pandémico, o modelo educacional assenta em metodologias que procuram ser efetivamente ativas, com uso frequente de recursos digitais cada vez mais sofisticados, selecionados estrategicamente com vista a proporcionar um ensino envolvente, motivador e de qualidade, que contribua para formar jovens para o incerto mundo de amanhã. 

Atualmente, dividimo-nos entre o mundo físico e o mundo virtual. Munidos de telemóveis, com software e apps cada vez mais versáteis e “inteligentes”, e de outros equipamentos ou gadgets, acedemos a assistentes virtuais (como a famosa Alexa, da Amazon), a mundos sociais por meio das inúmeras redes sociais à nossa disposição, a jogos que apostam no Metaverso, com Realidade Virtual ou Aumentada. A omnipresença crescente da tecnologia que aposta gradualmente no Metaverso tem suscitado o interesse de alguns investigadores do mundo académico, começando a surgir estudos que visam equacionar as suas potencialidades no meio educativo, tendo surgido, nos últimos anos, várias experiências pedagógicas no ensino básico e secundário que evidenciam o alcance dessa tecnologia em educação.

⭕ Investigadores do Virtual Human Interaction Lab, da Universidade de Stanford,  desenvolveram uma experiência imersiva de realidade virtual, Becoming Homeless: A Human Experience, com vista a apurar o seu impacto na empatia dos envolvidos. Consistia em expor os participantes a uma situação de grande indigência, vivendo na “pele” de alguém que deixa de conseguir pagar a sua casa. Os resultados revelaram a eficácia das experiências de realidade virtual para alterar comportamentos de forma duradoura, afirmando-se uma ferramenta poderosa para ajudar as pessoas a colocar-se no lugar do outro, logo, para formar cidadãos democráticos, participativos e humanistas, numa época de diversidade social e cultural crescentes e dada a radicalismos violentos.

⭕ Douglas Kiang, mestre em Tecnologia, Inovação e Educação (Universidade de Harvard), e professor de Ciência da Computação numa escola em Honolulu, Hawai, fiel à metodologia da Aprendizagem Baseada em Desafios, envolveu os seus alunos num projeto com recurso ao metaverso - Minecraft 101: The Underwater Dome Project. Desafiou-os a criarem um espaço subaquático, respeitando alguns critérios previamente estabelecidos, o que originou um projeto colaborativo bastante enriquecedor que envolveu os alunos e que lhes permitiu desenvolver várias competências e capacidades: envolvimento, criatividade, comunicação, colaboração, confiança…

⭕ Hirsh-Pasek et al. (2022), na publicação A whole new world: Education meets the metaverse, exemplificam as potencialidades do uso do metaverso em educação, criando uma visão: uma sala de aula circular, com vários quadros brancos, onde alunos descobrem o mundo greco-latino, os seus deuses, o seu dia a dia, os seus espaços. Logo de seguida, o professor fá-los regressar ao presente, e as paredes recriam, então, as ruínas de templos, transformando-se os alunos, por meio dos seus avatares, em arqueólogos que têm de (re)descobrir o passado, colhendo fragmentos de cerâmica, moedas, estátuas… e partilhar essas descobertas com os restantes. Portanto, um cenário de aprendizagem verdadeiramente imersivo que oferece um contexto que favorece uma aprendizagem ativa, colaborativa e a cocriação.

De facto, o metaverso vai muito para além dos tradicionais meios digitais virtuais, em que o acesso à informação ocorre por intermediação de um browser, de um software que permite a navegação na internet, numa interface baseada em ambiente bidimensional de textos, de imagens estáticas ou em movimento. No metaverso, a navegação ocorre em ambientes tridimensionais que se modificam em tempo real, conforme os utilizadores vão interagindo com esses ambientes, convocando competências várias como a criatividade, a imaginação e uma variedade de formas de interação e comunicação. Isso implica uma mudança radical na forma de comunicar e no processo de ensino e de aprendizagem.  

Prevê-se que, em 2026, 25% da população mundial passe, pelo menos, uma hora por dia no metaverso para realizar diversas tarefas quotidianas como fazer compras, trabalhar, conviver ou para desenvolver atividades educativas. Ainda que se trate de uma tecnologia emergente e pouco consensual, já se percebeu que terá repercussões, a médio ou a longo prazo, no processo de ensino e aprendizagem, pelo que há que considerar os seus eventuais aportes para o meio educativo. Por isso, o metaverso já está a ser estudado e usado em alguns países, incluindo Portugal, para melhorar cursos e programas de formação em linha no ensino superior, sendo expectável, num futuro próximo, a expansão do recurso a essa tecnologia emergente nos vários níveis de ensino da escolaridade obrigatória.

Lepez (2022) destaca as potencialidades do metaverso em educação, já que pode proporcionar experiências de aprendizagem mais imersivas, interativas e enriquecedoras, que permitam aprender, experimentar e praticar de forma mais significativa em ambientes controlados. A simulação de situações e cenários reais tem vantagens, pois, para além de implicar ativamente os alunos de forma lúdica e inovadora, evita riscos, sendo particularmente vantajosa em áreas relacionadas com a medicina, a engenharia e a arquitetura, uma vez que possibilita experiências sem efeitos colaterais no mundo real, mas que dão origem a aprendizagens efetivas e significativas.

Para uma aprendizagem mais interativa e imersiva, podem ser simuladas experiências laboratoriais ou outras, visitas a museus ou a monumentos históricos, viagens a países longínquos, ao fundo do mar, ao espaço ou ao passado! Assim, com esta tecnologia, passa a ser possível uma miríade de ambientes que proporcionam situações de aprendizagem dificilmente concretizáveis nas salas de aula do mundo real, pela sua inexequibilidade em termos logísticos e humanos. Além disso, pode possibilitar um ensino diferenciado e mais inclusivo, visto que, ao eliminar as barreiras entre o real e o virtual, esbate obstáculos físicos e comunicacionais e contribui para aprendizagens significativas que preparam os alunos, mesmo aqueles que apresentam algum tipo de limitação, para o mundo real, proporcionando-lhes experiências únicas.

Acresce, ainda, o facto de o uso do metaverso em educação facilitar a abordagem  a conceitos mais complexos e abstratos, de forma mais prática e acessível, ao mesmo tempo que pode atenuar ou eliminar limitações intrinsecamente humanas, como a impossibilidade da ubiquidade, de viajar no tempo, entre outras, por permitir que os alunos participem em situações de aprendizagem a partir de qualquer ponto do mundo, no momento que lhes for mais favorável, não dependendo da disponibilidade nem da presença física do professor, muito embora este esteja sempre “presente”. É essa a posição de Hirsh-Pasek et al. (2022), quando referem que o metaverso é apenas um contexto – um contexto imersivo – que pode pôr ao serviço da educação o melhor das tecnologias digitais, porém implica considerar os aportes da ciência da educação e da psicologia educacional e encontrar formas de fundir os mundos virtual e real, preservando as relações sociais professor-aluno.

Face ao exposto, o uso do metaverso em educação implica apostar em políticas públicas inclusivas, que invistam no apetrechamento das escolas com os equipamentos e com a tecnologia necessária (por exemplo, óculos de Realidade Virtual e tecnologia de telecomunicações 5G), mas também melhorar a cobertura das redes de alta velocidade, favorecendo o acesso generalizado às mesmas. Para além disso, considerando que a tecnologia per se não garante inovação, há que apostar na formação de professores nesta área, de modo a que a rentabilização desta tecnologia com recurso ao mundo virtual se salde em aprendizagens significativas e reais nos discentes.

Em suma, a rápida evolução tecnológica fez emergir uma tecnologia capaz de criar realidades que, até recentemente, só existiam na literatura e nos filmes de ficção científica. Essa tecnologia transformou a forma como nos relacionamos, como comunicamos, como aprendemos e ensinamos, por isso, há que abrir a escola, a biblioteca e as salas de aula ao metaverso, para aproveitar as virtualidades pedagógicas que oferece, pondo-as ao serviço de uma educação holística e de qualidade.

 

Bibliografia

1. Backes, L. (2013). Hibridismo tecnológico digital: configurações dos espaços digitais virtuais de convivência. Colóquio Luso-Brasileiro de Educação a Distância e Elearning. Universidade Aberta. http://hdl.handle.net/10400.2/3050

2. Daccord, T. (2022, 19 de setembro). Making Sense of the Metaverse in Education. EdTechTeacher. https://edtechteacher.org/making-sense-of-the-metaverse-in-education/

3. Hirsh-Pasek, K., Zosh, J. M., Hadani, H. S., Golinkoff, R. M.,  Clark, K., Donohue, C.  & Wartella E. (2022). A whole new world: Education meets the metaverse. Center for Universal Education. Brookings Institution. https://www.brookings.edu/wp-content/uploads/2022/02/A-whole-new-world_Education-meets-the-metaverse-FINAL-021422.pdf

4. Kiang, D. (2019, 27 de setembro). Minecraft 101: The Underwater Dome Project.   ISTE Bog.https://www.iste.org/explore/In-the-classroom/Minecraft-101%3A-The-Underwater-Dome-Project?articleid=155

5. Lepez C.O. (2022). Metaverso y educación: una revisión panorámica. Metaverse Basic and Applied Research Metaverse. 1:2. https://doi.org/10.56294/mr20222

6. Marques, W. R. (2022). Metaverso e educação: uma revisão da literatura. RECIMA21 - Revista Científica Multidisciplinar. 3(10). https://doi.org/10.47820/recima21.v3i10.2064

7. Moreira, A. W.dos S. & Ribeiro, W. A. (2022). O uso do metaverso no processo de ensino e aprendizagem. [Trabalho de Conclusão de Curso]. Universidade Católica do Salvador.  http://ri.ucsal.br:8080/jspui/handle/prefix/4832

8. Motta, E. (2022). Metaverso e o Impacto na Educação. [MINICURSO]. https://www.youtube.com/watch?v=ST69YDdf5Hw/

9. Schlemmer, E. & Backes, L. (2008). METAVERSOS: novos espaços para construção do conhecimento. Revista Diálogo Educacional. 8(24). p. 519-532. https://www.redalyc.org/articulo.oa?id=189116834014

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